Por: Jease Costa
Por conta do ofício, tanto como
professor de teologia quanto como pastor de uma igreja local, volta e meia sou
levado a reler a história da igreja. É verdade que desde os primórdios a igreja
sempre sofreu com problemas de comportamento e distorções teológicas em sua
caminhada, e foi fortemente prejudicada com a inadequação de líderes
gananciosos e dominadores. Entretanto, todas as vezes em que estava à beira de
um colapso ela reagia firmemente com uma volta radical aos valores e princípios
que a definiam.
Na leitura que faço, entendo que
nosso momento pode ser comparado aos seus piores. Isso porque o que tem
caracterizado a igreja é justamente aquilo que ela devia repudiar. O que tenho
visto é líderes gananciosos que se gabam diante do público por conta do luxo e
do poder que conquistaram em nome da fé; líderes arrogantes que mais se parecem
com muitos dos déspotas autoritários do passado que manipulavam e dominavam o
povo como se fossem a encarnação da própria divindade. Vejo uma fé que, ao
invés de estimular à razão e ao bom senso, tem forte apelo emocional, onde as
pessoas são levadas a “sentir” ao invés de serem estimuladas a reformarem a
vida. Ouço sermões que mais parecem a leitura do último lançamento de um livro
de autoajuda, ao invés de convocarem os ouvintes a depositarem a confiança no
Deus do alto. Vejo as pessoas sendo estimuladas a viverem suas vidas de fé com
base em jargões e clichês evangélicos (tipo: “eu sou cabeça, não sou cauda!”,
ou “está amarrado!”), ao invés de aplicarem os valores do Reino de Deus à vida
real, às lutas e mazelas das realidades humanas. E o que dizer dos cultos? Os
cultos que deveriam ser dedicados a Deus são verdadeiros cultos à
personalidade, nos quais os líderes recebem o status de Deus. Nesses cultos não
importa se Deus não está presente, até porque não é Ele a estrela principal,
desde que esteja presente aquele pastor, aquele líder cujo levantar das mãos já
é suficiente para causar frenesi. E as pessoas não são estimuladas a
participarem desses cultos com o propósito de adorar a Deus, mas com o
propósito de se sentirem bem, com todas as suas expectativas pessoais
satisfeitas, tornando o culto antropocêntrico, ao invés de cristocêntrico. Como
resultado de tudo isso, o que se vê é homens e mulheres que se dizem cristãos,
mas que na prática o que se menos percebe é cristianismo, com uma forte tendência
materialista e com uma vida marcada pela dicotomia, na qual a vida que se vive dentro do contexto dos templos lotados não se coaduna com a vida cotidiana. E
como se não bastasse, esse povo é ainda acometido pela incapacidade de fazer uma
autocrítica construtiva, capaz de ajuda-lo a reler e remodelar sua caminhada
pessoal e histórica. Hoje, ser cristão é um grande negócio. As pessoas lotam as
igrejas para terem algum tipo de lucro, até porque se promete o reino da terra, ainda que alguns estejam lucrando
muito mais em cima delas.
Lembro-me agora de Policarpo,
bispo de Esmirna, no século II, e discípulo do apóstolo João. Consta de uma
fonte histórica que antes de ser martirizado por sua fé genuína foi-lhe dada a
chance de renega-la. Nessa hora suas palavras foram: “Sirvo a Jesus por várias
décadas em minha vida, e ele nunca me decepcionou. Eu não iria decepcioná-lo
agora”. Policarpo revela que cristianismo também tem a ver com a vida que se
deixa entregar por Jesus. Os cristãos de hoje, ao contrário, querem ganhar tudo
por meio de Jesus.
Realmente tem alguma coisa muito
errada com os cristãos hoje!
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