Por: Jease Costa
É bom que se diga que quando fazemos uma crítica
ao comportamento da igreja não estamos deixando de considerar o fato de haver
muitas igrejas locais cuja vida é marcada poderosamente pela vida de Jesus e
cujo comportamento dignifica a missão outorgada pelo Mestre. Entretanto,
entendo que, em termos de uma influência mais marcante no mundo, a igreja
contemporânea tem perdido o fulgor de seu brilho. Não que, em essência, a sua
glória não exceda ao fulgor de qualquer luz, mas porque, na medida em que o
tempo passa, ela vai deixando pelo caminho as marcas que fazem dela a igreja
gloriosa do Senhor.
É verdade que, uma vez que o mundo jaz no
Maligno, a reação natural é de resistência ao Evangelho de Jesus. Entretanto,
não podemos creditar à propensão para a resistência por parte dos incrédulos o
nosso fracasso em relação àquilo que devemos ser. Sempre houve resistências ao
Evangelho. No entanto, de igual modo, sempre que houve por parte da igreja um
comprometimento vital com as exigências do Reino, essas resistências foram
vencidas, o nome de Jesus glorificado e muitas vidas entregues arrependidas aos
seus pés. O Evangelho sempre prevalece quando há lealdade e integridade porque
sua origem é o próprio Deus, que não pode ser derrotado e nem subjugado pela
índole humana. Mas, uma vez que o Senhor decidiu, pela Sua graça, entregar à
igreja a missão de glorificá-lO no mundo, não podemos fechar os olhos para o
fato de que nossa conduta interfere profundamente na eficácia de nossa mensagem
e obra. Em sua carta à igreja de Roma, Paulo diz aos judeus daquela igreja,
fazendo referência ao profeta Isaías (52:5), que, “por causa deles, o nome do
Senhor era blasfemado entre os gentios” (Rm 2:24). É séria a nossa
responsabilidade! As marcas de vida que deveríamos deixar no mundo têm sido
substituídas pelas marcas da blasfêmia e ignomínia. E o pior de tudo é que o
nosso comportamento é o maior responsável por tudo isso.
Há muitas causas para essa dura realidade, mas
quero abordar quatro. A primeira é a postura de nossas lideranças. Alguém já
disse que a igreja tem a visão que lhe é dada. O que temos visto é uma
liderança comprometida consigo mesma e não com as causas do Reino. O princípio
do serviço tem sido trocado pelo do domínio. Aqueles que deveriam ser servos de
todos têm sido seduzidos pelo poder e levados à tirania, que é própria dos que
já se deixaram corromper. E a corrupção já permeou o coração em vários níveis,
mas o mais profundo é o moral. Líderes que deturpam a verdadeira mensagem da Palavra
para alcançarem objetivos puramente humanos (para não dizer malignos!), vendem
a fé, barateiam as exigências do Evangelho e banalizam a Graça. Estamos
carentes de homens e mulheres de Deus à frente do rebanho!
A segunda causa é nossa teologia. A teologia
bíblica tem sido trocada pela teologia da conveniência. Deus e as realidades de
Sua Pessoa e vontade não são mais o que a Bíblia ensina em essência, mas aquilo
que alguns querem que sejam. A teologia está descendo do pedestal do
teocentrismo para o do antropocentrismo. E seja no misticismo exacerbado, na
frieza intelectual ou na interpretação liberal, o que se busca não é a glória
de Deus, mas o bem-estar do homem. Deus não é mais aquele que deve ser amado,
adorado e servido, a despeito de toda e qualquer circunstância, mas aquele que
deve nos servir em toda e qualquer circunstância. Assim, nossa teologia tem nos
levado ou a um intelectualismo vazio, a um misticismo sem propósito bíblico ou
a um viver frouxo, em termos de uma submissão ao que Ele exige de todos nós.
Precisamos de uma teologia que sirva não apenas para entendermos as coisas a
respeito de Deus ou para buscarmos experiências sobrenaturais, mas,
fundamentalmente, para termos orientação para chegarmos mais próximos dEle e
usufruirmos de Sua vida, Pessoa e vontade, e aplicarmos esses princípios em
cada momento do nosso viver, até porque são nesses pequenos detalhes da vida
que a realidade de Deus em nós deve se fazer valer.
A terceira causa é a vida dos crentes. Talvez
esse seja o motivo que mais se ressalte por uma causa muito simples: é na
conduta dos crentes que o mundo pode ter uma noção do que deve ser a igreja de
Jesus. Nosso tempo tem sido marcado pelo total descompromisso com o Evangelho
por parte dos que se dizem evangélicos hoje. A glória da igreja se perdeu na
vida dos crentes. A luz não tem sido refletida porque tem sido ofuscada na vida
incoerente, contradizente e inadequada do povo que é chamado de povo de Deus.
Há várias metáforas bíblicas para se referirem ao que deve ser o comportamento
dos crentes: luz, perfume, carta, etc. Tudo com o propósito de dizer que
devemos transmitir algo. Como luz, refletir, iluminar; como perfume, atrair;
como carta, uma recomendação, que é a idéia do que Paulo quis dizer à igreja de
Corinto. O fato é que, independentemente da metáfora, temos algo a dizer, a
transmitir, a refletir. Se não cumprirmos com nosso papel, não serviremos para
o fim proposto. Infelizmente, o perfume exalado por muitos cristãos, hoje,
cheira mal, causa repulsa e franzir do semblante. Estamos carentes de homens e
mulheres, jovens e adultos, crianças e velhos completamente seduzidos pela vida
de Deus.
E a quarta causa da perda do brilho da igreja
contemporânea é sua conduta como igreja, a forma de seu culto. Está certo que
os tempos mudam e que a igreja deve ser relevante para o seu contexto e época,
mas isso não significa trocar o verdadeiro sentido do culto cristão por
modismos ou por momentos de “satisfação pessoal” dos presentes. Temos, hoje,
quatro tipos de igrejas: a fria, que é aquela que já morreu, mas se esqueceram
de sepultar. Temos também a da moda, que é aquela que acompanha todos os novos
movimentos, seja no estilo de música, de vestimenta, de linguagem, etc. Se você
quer saber a última onda, é só ir lá. Depois, a igreja que é “legal”. O pastor
sempre prega sermões light, e tudo é feito para agradar as pessoas. Ninguém é
desafiado a mudar de vida e entregar o coração definitivamente a Jesus. O
importante é as pessoas se sentirem bem. É como se estivessem em um restaurante.
A pessoa vem, se senta, é servida. Os garçons estão sempre a postos para que
ninguém fique insatisfeito. Oferecem uma água, um cafezinho e depois dizem:
“esperamos que tenha gostado e que volte sempre”. E, por fim, temos a igreja
realmente bíblica, comprometida com Deus e Sua vida; seu ensinamento é a
verdade, e sua conduta, forma de ser e cultuar expressam firmemente o propósito
daquele que é seu Redentor e Senhor. Nessa igreja as pessoas são desafiadas a
amarem a Deus sobre todas as coisas e a fazerem do culto coletivo uma
oportunidade de servirem e adorarem ao Pai com um coração submisso e pronto a
obedecer. Mas essa igreja, infelizmente, não tem sido fácil de achar, até
porque não dá ibope. Há algum tempo atrás, quando cheguei a uma das igrejas que
pastoreei, na primeira reunião uma irmã me fez um pedido que jamais esquecerei.
Ela me disse: “Pastor, nossa igreja precisa voltar a ser igreja”. Talvez seja
essa uma das grandes necessidades da igreja contemporânea: ela precisa voltar a
ser igreja. Essa igreja deturpada de hoje é, em parte, uma herança que nos foi
deixada. Com isso não estou querendo criticar os que vieram antes de nós, nem
dizer que não temos participação no que temos vivido. É claro que temos. Mas,
não há como negar que a visão que temos alguém no-la deu. Portanto, a pergunta
necessária é: Se o que somos é herança que nos deixaram, que igreja deixaremos
como herança para as futuras gerações?
Que Deus nos dê a graça de que nossa geração se
humilhe diante do Senhor eterno, e que, em atitude de arrependimento, rasguemos
as nossas vestes e derramemos pó e cinzas sobre nossas cabeças para que alcancemos
misericórdia e Graça, e a luz volte a brilhar, e a glória de Deus se manifeste
poderosamente através de nossas vidas, e o mundo veja nossas boas obras e
glorifique ao nosso Pai, que está nos céus. E amanhã, quando algum desavisado
perguntar: onde está a igreja gloriosa do Senhor? Que todas as igrejas que se
reúnem em nome de Jesus se apresentem e digam com o coração aberto e santo:
Eis-nos aqui!
Soli Deo gloria!
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