quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

PERU SEARA – AÍ, SIM, É NATAL!


Por: Jease Costa

É com essa frase que termina a propaganda do Peru de Natal Seara, com a simpática culinarista Dona Palmirinha Onofre. Bem, pra quem gosta de peru, a propaganda realmente deixa a água escorrer na boca. Mas, a despeito disso, a chamada estimula a uma boa reflexão: O que faz o Natal ser, realmente, Natal?

Essa reflexão não é nova, e muito já se tem falado a respeito do verdadeiro sentido do Natal. Mas há algo ainda não muito explorado na reflexão crítica sobre forma consumista que o Natal é pensado e vivido em nosso mundo cristão, que é o alastramento das carências humanas. Ou seja, não é apenas a idéia de que não há Natal sem um peru assado sobre a mesa, mas também o sentimento de que somos incompletos sem ele. O sentimento não é só que o Natal não é Natal se não houver peru, presentes ou roupas novas, mas que nós também não somos nós. E, assim, o Natal de nossa sociedade consumista nos torna reféns dele mesmo, de nossas carências e de seu sentido deturpado.

É exatamente aí que se revela uma de suas maiores distorções, uma vez que Jesus, esse, sim, que não pode faltar no pensamento natalino, veio para fazer justamente o oposto. Ele veio para suprir carências, e, não, alastrá-las. Na verdade, quem tem Jesus encontra plenitude de alma mesmo que lhe faltem coisas até mesmo necessárias, uma vez que sua presença enche a vida de significado. O evangelista João diz que “nele estava a vida” (1.4). Se nele estava a vida, quem o tem também a tem.

Então, é uma questão de escolha sobre o que realmente importa. Ou você escolhe o Peru Seara e, embora de estômago cheio, continue de alma vazia, ou escolhe Jesus, e, mesmo se não for possível ter um suculento peru em sua noite natalina, terá garantida sua alma plena.

Eu desejo que sua mesa esteja farta. Mas isso não é o mais importante. O importante mesmo é ter Jesus. Aí, sim, é Natal!

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

CULTOS NA CASA DO TRAFICANTE


Por Isaltino Gomes Coelho Filho

No boletim da PIB de Vila Formosa, de Sampa, vi a notícia, tirada da Internet, que  Antônio Bonfim Lopes, o Nem, chefe do tráfico na Rocinha, fazia cultos em sua casa. Ele disse: “Não vou para o inferno. Leio a Bíblia sempre, e faço cultos em minha casa, chamo pastores”.

Não sei o que pregaram em sua casa. Tampouco que textos bíblicos lhe deram para ler. Sobre bênção? Prosperidade? Não sei, mas o evangelho é que não. O evangelho chama ao arrependimento e mudança de vida (Mt 3.2, 4.17 e At 2.38). Mas, para muita gente, se cantou algum corinho, falou alguma coisa sobre Deus, fez alguma oração, se pregou o evangelho. O que pregaram na casa do Nem para ele dizer que vai para o céu porque faz cultos e chama pastores? Desde quando pastor ou culto salvam alguém? O problema é que muita igreja não fala de salvação, nem de céu ou inferno, apenas de prosperidade, saúde e vida feliz. Pregam bênçãos e não Jesus Cristo, o Salvador. Elas são o mel, não o sal de terra. Adoçam a boca do mundo, para atrair clientes.

Quando Steve Jobs morreu, alguns evangélicos se zangaram porque alguém disse que partiu sem Cristo. Veio o coro já gasto: “Não julgueis”, de gente que se esquece que a Bíblia sinaliza bem e que Jesus disse para julgar: “Não julgueis pela aparência mas julgai segundo o reto juízo” (Jo 5.24). Jobs era budista. O budismo é uma religião atéia e ele mesmo pediu que não se fizesse nenhuma cerimônia religiosa. Era paparicado pelos internautas, e estes o colocaram num céu que ele não cria nem queria. Mas Nem era o homem do dinheiro e do poder. Talvez fosse paparicado por igrejas e pastores. O dinheiro tem tomado o lugar de Jesus, em muita pregação.

A questão não é Nem ou Jobs, mas o que se prega como sendo o evangelho. Há uma feroz competição por público e isto cria uma preocupação em alguns de fidelizar clientes, dando-lhes o que eles querem. Um dos líderes do movimento de mega-igrejas, indagado da razão de tanta gente em seus cultos, disse: “Nós damos ao povo o que o povo quer”. Mas o evangelho não é dar ao povo o que ele quer, e sim o que Deus quer.

As pessoas precisam conhecer o amor de Deus mostrado na cruz. Precisam admitir que são pecadoras, estão longe de Deus, que sua vida não o agrada, e devem se arrepender e crer em Jesus. O evangelho não é auto-ajuda, e o Deus Santo não é o bonachão Papai Noel. Não se pode distorcer o evangelho ou amaciá-lo para atrair clientes.

A declaração de Nem é errada. Igrejas e pastores não são culpados por ela. Mas ela mostra que não lhe pregaram o evangelho. Continuou traficante e acha que se salvará porque faz cultos e recebe pastores. Ele não ouviu o evangelho.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Ainda há um preço a pagar


Por Jease Costa

2 Samuel 24.11-25
“Mas o rei disse a Araúna: Não! Antes te comprarei pelo seu valor, porque não oferecerei ao Senhor meu Deus holocaustos que não me custem nada. Comprou, pois, Davi a eira e os bois por cinquenta siclos de prata” (v.24).

Penso que compreendemos mal a graça por causa do preço da nossa redenção pago por Deus com o sangue de Jesus. Assim, agimos como se não houvesse mais nada a pagar em nossa relação com Deus e para recebermos o que ele tem a nos oferecer.

Davi viveu na era da lei, mas essa passagem nos ensina, pois mostra que a relação com Deus ainda exige um preço mesmo na era da graça. Ele havia cometido pecado e Deus mandou uma peste sobre Israel que matou sete mil homens. Para que o castigo fosse aplacado era necessário um sacrifício ao Senhor. Araúna quis doar o lugar e os animais para o holocausto, mas Davi não os aceitou sem pagar.

Há um preço que Deus pagou para a nossa redenção, mas ainda há outro que temos que pagar para vivermos no caminho dos redimidos. Devemos ofertar a nossa vida em sacrifício a Deus como o preço justo exigido.  Isso envolve o caminho da santidade, da adoração não negligente e do serviço a Deus como norma do viver.

Deus pagou o preço que só ele podia pagar, mas nós estamos dispostos a pagar o preço que nos compete?

domingo, 2 de outubro de 2011

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

A ESPIRITUALIDADE E AS CARÊNCIAS HUMANAS

Por Jease Costa

O fato dos cristãos se sentarem em torno de um mesmo livro como autoridade de fé pode justificar a pergunta a respeito da qual se questiona as discrepâncias que existem entre os vários segmentos denominacionais. Entretanto, as discrepâncias não encontram lugar apenas na diversidade denominacional, sendo também possível percebê-las entre os que afirmam comungar das mesmas bases doutrinárias. Ou seja, pessoas que freqüentam as mesmas igrejas se posicionam de forma diferente ou, até mesmo, contraditória no que se refere à prática da fé, à compreensão de Deus e ao modo como ele se relaciona com as pessoas.

Devemos admitir que a resposta para esse fenômeno não é tão simples, pois devem ser considerados vários fatores, entre os quais a experiência e as expectativas religiosas de cada pessoa ou grupo, embora devamos considerar que esses fatores especificamente não são os mais adequados para nos ajudar a estabelecer um sistema de prática de fé capaz de nortear a vida de forma saudável e equilibrada. Na verdade, em se tratando principalmente das expectativas religiosas de cada pessoa ou grupo, talvez comece aí o caminho das deturpações da espiritualidade. Isso porque temos a tendência de interpretar o texto sagrado não a partir dele mesmo, mas de nós, de nossas carências e necessidades. Nesse caso, o elemento norteador da espiritualidade não é mais a Revelação bíblica, mas o homem a partir de suas carências. E aí, em vez de Deus nos construir a partir de quem ele é, nós o construímos a partir de quem somos. Os resultados disso são uma espiritualidade frágil, uma religiosidade deturpada, uma prática de fé vulnerável e algumas igrejas com princípios doutrinários tão antagônicos que até parece se tratar de outras religiões que não a bíblica.

Se a interpretação de Deus é feita a partir de nós mesmos, talvez isso justifique a grande quantidade de devotos frustrados com a sua fé, uma vez que o Deus que queremos construir deverá estar constantemente ocupado com o nosso bem-estar e nos suprindo a cada momento de todas as nossas necessidades. Com isso, formamos um conceito de religiosidade em que a espiritualidade de alto padrão não pode se compatibilizar com as necessidades humanas. Nesse caso, passar por privações é o mesmo que estar em desacordo com Deus. Como sempre teremos algum tipo de privação ou carência, a relação com Deus, a partir desse conceito, está gravemente comprometida. O que precisamos de mais urgente, se queremos recuperar a saúde e o equilíbrio da fé, é de um virar as costas para nós mesmos, como centro de referência da espiritualidade, e nos voltarmos para Jesus, que é a Palavra encarnada de Deus. Quando ele voltar a estar no centro de tudo sem ser contaminado com nossas conveniências e expectativas, a espiritualidade terá um padrão confiável e compreenderemos que a relação com Deus pode ser produtora de vida mesmo em meio às carências humanas mais profundas. Na verdade, a espiritualidade elevada não é incompatível com as carências humanas.

O texto de Mateus que registra a experiência de Jesus sendo tentado no deserto é revelador nesse caso. O texto diz assim: Jesus foi, então, conduzido pelo Espírito ao deserto para ser tentado pelo Diabo. Depois de jejuar quarenta dias e quarenta noites, teve fome. O tentador aproximou-se então dele e disse: “Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em pães”. Jesus, porém, afirmou-lhe: “Está escrito: ‘Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus’” (Mateus 4.1-4 KJA). É revelador o fato de que Jesus “depois de jejuar, teve fome”. A fome é uma das mais fortes expressões das carências humanas, e jejuar é um dos elementos da prática da espiritualidade de maior demonstração de devoção. O fato de Jesus ter fome depois de jejuar nos revela que a necessidade humana não é incompatível com a espiritualidade de elevado padrão. O conceito que formamos de Deus a partir do que somos, e de que Deus tem o dever de nos suprir de todas as nossas carências porque nos firmamos em práticas que demonstram boa espiritualidade, não tem origem na proposta divina. Foi o tentador quem disse isso:“Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em pães”. Jesus mostrou que é possível viver como filho de Deus mesmo sem estar suprido do pão. A bem da verdade, se Jesus resolvesse seu problema da fome do modo como o tentador lhe sugeriu, acabaria por criar uma grande tensão teológica. Isso em dois aspectos. Em um primeiro plano ele comprometeria a identificação divina com o homem ao resolver desse modo o seu problema, já que conosco não ocorre assim. Como Deus se identificaria com a humanidade, já que Jesus é Deus encarnado, recusando-se a passar pelas mesmas privações dos seres humanos? E, em segundo plano, uma vez que Deus pretendia se identificar conosco na pessoa de Jesus, tendo suprido sua própria carência teria também o dever de nos suprir das nossas. Mas, mesmo nesse caso, o problema persistiria, pois em vez de ele se identificar conosco em nossa humanidade, nós é que estaríamos identificados com ele em sua divindade, uma vez que Deus de nada tem falta. Assim, nossa humanidade estaria comprometida, pois os cristãos seriam menos humanos que os demais.

 Um dos elementos que definem a fragilidade da espiritualidade contemporânea reside no fato de que queremos um Deus que esteja a nosso serviço. Entretanto, um dos elementos mais gloriosos da espiritualidade bíblica é que temos um Deus a quem servir durante toda a vida e em todas as circunstâncias. É possível estar num deserto e sentir a presença de Deus. Ter fome não é incompatível com o ato de jejuar. Estar bem com Deus não é incompatível com o não estar bem em todas as áreas da vida, pois, como Jesus respondeu ao tentador, não é só de pão que vive o homem. Na experiência de Jesus, depois de tudo os anjos vieram e o serviram. Em nossa experiência com Deus, se nos mantivermos nele, ele também virá ao nosso encontro. Não nos deixará abandonados e sós. A experiência mais gloriosa da vida é andar com Deus, ainda que em desertos e com falta de pão.

sábado, 27 de agosto de 2011

As Marcas do Cidadão dos Céus

Por Jease Costa


Salmo 15
“Aquele que anda irrepreensivelmente e pratica a justiça, e do coração fala a verdade;” (v.2).

Na “Oração do Pai Nosso” Jesus ensina que devemos ansiar pela vinda do Reino de Deus a nós. Isso se refere ao governo de Deus e também aos valores do seu Reino, tanto morais quanto espirituais. Mas algumas perguntas precisam de resposta: como é que vem o Reino? Como seus valores se inserirão em nosso meio? A resposta é simples e prática. O Reino de Deus acontece em nosso coração, e seus valores se inserem entre nós na medida em que os praticamos. Devemos lutar por aquilo que oramos; os súditos do Reino de Deus devem expressar um comportamento que reflita seus valores.

Davi, nesse belo salmo, revela sua compreensão dessa verdade. A sua resposta à pergunta sobre quem morará no santo monte do Senhor mostra claramente que aqueles que desfrutam da presença de Deus devem ter em seu comportamento características que reflitam traços do caráter de Deus.

O cidadão dos Céus tem as marcas do Reino dos Céus. Essas marcas o distinguem do reino do mundo e o identificam com seu Rei e Senhor.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O SENHOR TEM O SEU CAMINHO NA TORMENTA

Por: Luiz Sayão


As palavras de Naum 1.3 ecoam desde o juízo divino que caiu sobre Nínive no século VII a.C. Mais do que nunca elas nos falam nestes dias difíceis.

Nem todos imaginam que a perspectiva do homem bíblico do Antigo Testamento possui total distinção da do homem contemporâneo secularizado e humanista. A antigüidade, como qualquer época da história humana, estava acostumada a catástrofes de todo tipo, inclusive as naturais. A revelação bíblica do AT distinguia-se da visão de mundo naturalista do paganismo do antigo Crescente Fértil. No paganismo a natureza era divinizada, enquanto que em Israel YHWH tudo dominava e era transcendente em relação ao mundo fenomenológico. Apesar dessa polarização, ninguém partia do pressuposto de que o mundo estava sob o controle do homem e que as coisas deveriam prosseguir o curso planejado e esperado pela razão humana, que “entendeu as leis do universo” e é capaz de dominá-lo com maestria. Os antigos sentir-se-iam à vontade, em certo sentido, com algumas idéias de Kierkegaard, de Heidegger e até de Sartre. Eles compreenderiam a tremenda limitação do ser humano, sua impotência diante da mundo “estranho” que os cerca. Conscientes da realidade, os pagãos temiam os desastres naturais, atribuídos a divindades específicas. Baal e Astarote dominavam o cenário da cultura cananita, assim como Oxóssi e Iemanjá tem expressão em parte da cultura brasileira. Os homens imaginavam-se à mercê dos deuses, que poderiam atingi-los a qualquer momento. O pensamento bíblico rejeitou a idolatria pagã e destacou que YHWH era o verdadeiro e único Deus. Por isso, os deuses pagãos eram apenas imaginação dos povos. Apesar disso, o israelita nunca atribuiu a elementos não divinos a origem dos fenômenos. Uma leitura atenta do Salmo 29 revelará a apologética contra o baalismo e a ênfase de que YHWH é o verdadeiro Deus das tempestades. A voz do SENHOR do Salmo 29 é o trovão que estronda de modo assustador. De modo gereal, o sofrimento causado aos homens tem origem no próprio Deus. Em Rute, o sofrimento geral (fome) e também a dor específica (de Noemi) tem origem no SENHOR.

Uma perspectiva teísta não tem outra alternativa. É impossível imaginar que um desastre natural, como um tsunami, não tenha a ver com Deus. Isso significaria que a natureza opera independentemente da ação divina. A idéia de que os homens têm direitos e que Deus deve ser culpado pelos sofrimentos que lhes é causado marcam a tradicional revolta dos ateus e agnósticos que se limitam a ver a vida “debaixo do sol”. Por isso, em última instância, Deus tem o controle de tudo e de modo direto ou indireto (permitindo) é o “responsável” pelos desastres naturais.

Se pudéssemos conversar com o homem bíblico do Israel antigo, talvez não fosse tão difícil entender o seu raciocínio. Ele saberia, por exemplo, que Deus tinha sido responsável de modo direto por intervenções meteorológicas que causaram muitas mortes, como foi o dilúvio e a abertura (e retorno das águas) do mar Vermelho. Além disso, ele entenderia também que Deus é quem tira a vida de todos (Dt 32.39 – “eu mato, e eu faço viver”). Deus dá a vida e a tira. Em certas ocasiões, ele convoca algumas criaturas um pouco antes do momento esperado. O homem que mata é assassino, pois ele não pode tirar o que ele nunca deu. Mas este não é o caso de Deus. Por isso, nossos avós gostavam de dizer que um falecido havia sido “recolhido”.

O homem bíblico também geralmente costumava entender que tais atos divinos poderiam ser um lembrete ao ser humano de sua fragilidade e de sua pecaminosidade. A leitura dos salmos revela isso com freqüência (veja o Sl 130). A relação sofrimento e pecado ou fragilidade era comum. Os israelitas até cunharam o termo ’enosh para falar do homem como criatura frágil. O termo distingue-se de ’ish e de ’adam, e define o homem em sua distinção com relação ao divino.

Por isso, se um homem bíblico soubesse que a área atingida pelo tsunami é uma das regiões mais pagãs do mundo, é um local onde milhares de cristãos são perseguidos e assassinados, e também é um dos locais onde há maior exploração de prostituição infantil do mundo, ele consideraria a possibilidade de uma intervenção divina na região. Isso, sem contar com o fato de que ele não conheceria a escatologia neotestamentária (Mt 24) que prevê tais desastres, nem sabia das previsões dos geólogos de hoje. Se tivesse tais informações, ele talvez cresse que o tsunami seria um fenômeno bastante esperável.

O mais surpreendente é que ele, com sua perspectiva poli-alética, iria sentir muito com o sofrimento e chorar com toda a dor. Ele lidaria com a realidade de que Deus é ao mesmo tempo soberano, tem o direito de julgar e punir, tem amor por suas criaturas e sofre com elas e por elas, por causa de sua misericórida. Mas, talvez ele tivesse perguntas difíceis de serem respondidas, complicadíssimas até para qualquer visão “panto-alética” do mundo. Ele perguntaria por que um mundo que pratica 46 milhões de abortos por ano, defende todo tipo de abominação sexual, pratica escravidão para aumentar o lucro de quem tem recursos demais, que se cala diante de uma indústria global de tráfico de armas, drogas e prostituições fica tão “revoltado” com Deus pelo que aconteceu. Ele não entenderia onde está a lógica de quem defende o assassinato como direito (aborto e guerra) e “revolta-se” contra Deus.

Além disso, o homem bíblico também teria outra pergunta muita difícil: Diante de tanta maldade e injustiça, por que o Deus onipotente e justo não envia um tsunami por dia (ainda que morram 150.000 pessoas diariamente)? Talvez sua mente se consolasse com a as palavras do salmista: “a misericórdia do SENHOR dura para sempre” (Sl 136). Que bom! Deus resolver esperar um pouco mais! Ainda há chance de arrependimento e retorno!

quinta-feira, 23 de junho de 2011

HOMOSSEXUALIDADE – PONTOS DE VISTA E ADVERTÊNCIAS

Por: Jease Costa (esse texto é parte do meu livro "HOMOS-SEXUS", publicado pela editora Abba Press: www.abbapress.com.br)

Penso que a igreja deveria se portar com maior tolerância em relação aos homossexuais. Mas deixe-me dizer algo sobre a tolerância. Norman L. Geisler diz que a necessidade de tolerância pressupõe que algo está errado, uma vez que “nós não toleramos o bem; nós felizmente o aceitamos”. Sem querer provocar um debate filosófico sobre a tolerância, entendo que ela não necessariamente pressuponha um erro, mas também pode pressupor o diferente, ou um gosto pessoal, que não precisa inevitavelmente estar ligado a um valor moral. O problema da tolerância, a meu ver, não é se ela necessariamente pressupõe um erro ou não, mas a atitude de quem tem que tolerar alguém naquilo de que discorda. Ou seja, uma pessoa tem o direito de discordar de outra, mas isso não lhe autoriza a hostilizar, ferir e maltratar.

Por outro lado, ao mesmo tempo em que a igreja deve rever sua forma de lidar e tratar com os homossexuais, dela também não pode ser usurpado o direito de pensar diferente, de discordar e de considerar a homossexualidade inadequada ao padrão moral cristão. Considerar um determinado comportamento inadequado não significa falta de amor. A igreja pode (e deve) perfeitamente não aceitar a homossexualidade como uma conduta sexual adequada aos padrões bíblicos, ao mesmo tempo em que também pode (e deve) amar os homossexuais, reconhecendo neles valor e dignidade como seres humanos que foram criados à imagem de Deus e por quem Jesus também entregou sua vida.

Tenho também duas preocupações que quero expor aqui. A primeira é que, embora isso não seja prerrogativa de todos os homossexuais, parece-me que há uma forte tendência à promiscuidade por parte de uma grande parcela. Essa constatação vai ao encontro das estatísticas levantadas pelo Dr. Thomas Schmidt em seu livro Straight and Narrow? [Hetero e Medíocre?], em citação do Dr. William Lane Craig:

"Há uma promiscuidade quase compulsiva associada à prática homossexual. Por exemplo, 75% dos homens homossexuais têm mais de 100 parceiros durante a vida. Mais da metade desses parceiros são estranhos. Somente 8% dos homens homossexuais e 7% das mulheres homossexuais têm tido relacionamentos que duram mais de três anos [...] A média dos homens homossexuais tem mais de 20 parceiros por um ano. De acordo com o Dr. Schmidt, 'estatisticamente falando, é quase inexpressivo o número de homens homossexuais que experimentam algo parecido com fidelidade para a vida toda'".

Veja também um convite publicado na “Coluna do Meio” do jornal goiano Diário da Manhã, voltado para o público gay, feito pelo jornalista Liorcino Mendes Pereira Filho, presidente da Associação de Gays, Lésbicas e Transgêneros de Goiás e membro titular da Comissão Nacional de AIDS do Ministério da Saúde:

“Dentro do Cine Gay Astor, você encontra na parte de baixo filmes hetero e na de cima os de gênero gay. Dentro do dark room e no banheiro, além das famosas pegações, ocorre também sexo de dupla e grupal. Por apenas cinco reais a diversão vai até às dez da noite. Não se esqueça de levar camisinha e gel”.

Embora a promiscuidade seja inegavelmente um grave problema de toda sociedade, não deixa de ser preocupante sua grande incidência em termos proporcionais no universo homossexual.

Minha outra preocupação tem a ver com a postura dos homossexuais militantes em relação aos demais grupos sociais. Por conta da chamada “Lei da Homofobia”, ao invés de buscarem a coibição dos abusos contra os homossexuais, parece que há uma luta para se obrigar a todos a concordarem com a homossexualidade. Ao que parece, a comunidade gay tem uma forte tendência de se irritar com qualquer pessoa ou grupo que se manifeste de forma contrária à comunidade, ou de classificar como homofóbico qualquer um que se posicione de modo diferente ao esperado pelas organizações homossexuais. O médico Eduardo Ribeiro Mundim diz que “a lei da homofobia parece visar aqueles que agridem verbal, moral e psicologicamente os homossexuais. [Mas] existe um ativismo homossexual que, em determinados momentos, parece querer converter todos a homossexuais ou obrigar a aceitação da homossexualidade”. Ou seja, usa-se do mesmo mecanismo da intolerância para se coibir a intolerância.

Quero expor, ainda, em tom de alerta e informação o que as estatísticas mostram em ralação aos homossexuais no que diz respeito à propensão a doenças, tanto relativas à dependência química quanto às doenças emocionais e físicas.

O Dr. Craig diz que “em geral, os homossexuais representam um número três vezes maior do que a população com problemas com o alcoolismo. 47% dos homossexuais masculinos têm em seu histórico de vida o uso excessivo de álcool, e 51% o uso excessivo de drogas”. E, de acordo com as pesquisas do Dr. Schmidt, “há uma evidência avassaladora de que certos distúrbios mentais ocorrem com frequência muito mais elevada entre homossexuais”. As estatísticas do Dr. Schmidt apontam que 37% das mulheres homossexuais apresentam um histórico de depressão, e nos homens homossexuais é de 40%, quando apenas 3% dos homens de um modo geral enfrentam esse problema, o que tem elevado o potencial de suicídio entre os homossexuais em relação aos heterossexuais para três vezes mais. Isso sem contar os outros problemas de saúde que vão desde a AIDS à Hepatite B, além de problemas na próstata, úlceras e fissuras, incontinência crônica e disenteria. E, como não podia ser diferente, isso tudo acarreta na diminuição da expectativa de vida em comparação com os heterossexuais.

Como não poderia ser diferente, há contestações sobre esses dados sob a afirmativa de que heterossexuais também apresentam todos esses problemas desde a promiscuidade às doenças, sejam a dependência química, os distúrbios emocionais ou doenças de ordem físicas e orgânicas. É verdade. Porém o propósito da exposição desse quadro é mostrar que, proporcionalmente falando, há uma incidência maior entre os homossexuais, o que deveria despertar maior preocupação e interesse.

terça-feira, 21 de junho de 2011

UM HOMOSSEXUAL JÁ NASCE HOMOSSEXUAL?

Por: Jease Costa (esse texto é parte do meu livro "HOMOS-SEXUS", publicado pela editora Abba Press - www.abbapress.com.br)


O que diz a ciência

Apesar de haver divergências no meio científico quanto à resposta à pergunta se um homossexual nasceu ou não homossexual, ao que parece, em muitos casos essas divergências ocorrem muito mais por motivações políticas do que científicas propriamente ditas. Isso porque uma parte dos cientistas que consideram a homossexualidade congênita está comprometida com o ativismo em prol da causa homossexual e com os meios de comunicação de massa, para os quais pode ser conveniente a afirmação da tese de que o homossexual já nasceu assim. Entretanto, boa parte dos cientistas não influenciados por essas motivações tem rechaçado com certa veemência essa teoria.

Joseph Nicolosi e Linda Ames Nicolosi dizem o seguinte a respeito da teoria do “nascido assim”:

"O exame mais preciso da evidência oferece esta revelação surpreendente: os cientistas, cuja pesquisa supostamente provou a teoria do 'nascido assim', agora concordam que isso é um mito. Dizem que, em algumas pessoas, as influências genéticas e biológicas abrem a porta para a homossexualidade, mas admitem que o acréscimo de influências do meio ambiente (isto é, pais, sociedade e experiências pessoais) é que fazem com que o indivíduo atravesse essa porta e se confirme como homossexual".

Com isso não se está afirmando que os genes não exerçam algum tipo de influência, mas que não são por si só determinantes. Joseph e Linda Nicolosi citam o Dr. Judd Marmor, ex-presidente da Associação Americana de Psiquiatria e apoiador do ativismo homossexual, que admite que:

"A não-conformidade de gênero induzida biologicamente é um “fator facilitador” que pode estabelecer fundamentos para a homossexualidade, pois faz a criança com não-conformidade de gênero ver a si mesma de forma diferente, e também faz com que ela seja rotulada de diferente pelos outros. [...] Mas a homossexualidade é de maneira nenhuma inevitável, pois, como muitas vezes já se notou, meninos constitucionalmente 'efeminados' ou meninas 'masculinizadas' podem desenvolver relacionamentos heterossexuais normais quando o meio-ambiente familiar e as oportunidades para a identificação apropriada de papel de gênero são favoráveis".

Há alguns que, para justificar a tese do “nascidos assim”, se utilizam de argumentos através dos quais procuram colocar a orientação sexual no mesmo patamar das multiformes características físicas que são determinadas pela informação genética, como a cor dos olhos, a destreza ou a cor da pele. O psicoterapeuta, educador e teólogo Dr. Daniel A. Helminiak (O que a Bíblia realmente diz sobre a homossexualidade), corroborando com essa argumentação, faz a seguinte argumentação:

"A maioria das pessoas é heterossexual, mas algumas são lésbicas, gays ou bissexuais. Algumas são altas e outras, baixas. Algumas são pretas ou pardas, enquanto outras são amarelas, vermelhas ou brancas. Alguns são homens, a maioria é de mulheres. A maior parte é composta de destros, mas há alguns canhotos. Há uma ampla gama de diferenças individuais entre os seres humanos. A orientação sexual parece ser uma destas diferenças".

O problema dessa argumentação é que ela desliza ao colocar em uma mesma fonte determinante, a saber, os genes, aquilo que é característica física e o que é característica da personalidade. Porém, embora se possa realmente admitir que o componente genético possa abrir uma porta de propensão para a formação de traços da personalidade, ao que parece apenas isso não é um fator determinante. A genética determina as características físicas, mas as características da personalidade são construídas, podendo contrariar a propensão induzida pelos genes.

Outra base de dados importante para ser considerada é a que está indicada nos estudos de gêmeos. Isso porque gêmeos idênticos têm genes idênticos, e, nesse caso, se um dos gêmeos é homossexual o outro também deveria ser, considerando-se que a homossexualidade fosse definida unicamente por influência genética. Mas veja o que diz o Dr. Neil Whitehead, um cientista que fez um estudo em gêmeos idênticos: “Gêmeos idênticos têm genes idênticos. Se a homossexualidade fosse uma condição biológica produzida inevitavelmente pelos genes (tal como a cor dos olhos), então se um gêmeo idêntico fosse homossexual, em 100% dos casos seu irmão também seria. Mas sabemos que apenas em cerca de 38% dos casos os gêmeos idênticos são homossexuais. Se um é homossexual, em geral o outro não é”.

Veja ainda o que disse o Dr. Simon LeVay, homossexual ativista e autor do estudo Cérebro Gay: “É importante enfatizar o que não descobri: Não provei que a homossexualidade é genética; não demonstrei que os homossexuais nascem assim. Este é o erro mais comum que as pessoas cometem na interpretação de meu trabalho”.

Seguem, então, as conclusões das pesquisas científicas ao buscar respostas à pergunta se um homossexual já nasceu assim:

• A associação Americana de Psicologia (que tem muitos ativistas homossexuais em posição de liderança) dá algum crédito à teoria do “nasceu assim”, mas, a seguir, acrescenta que “muitos cientistas compartilham o ponto de vista de que a orientação sexual é formatada na maioria das pessoas por meio de interações complexas de fatores biológicos, psicológicos e sociais na primeira infância”.
• Simon LeVay, o “pesquisador do cérebro homossexual”, afirma: “Em relação a esse ponto a opinião mantida pela maioria [sobre a causa da homossexualidade] é que múltiplos fatores desempenham um papel no processo”.
• O folheto do grupo de apoio ao homossexual declara: “Até o momento nenhum pesquisador afirmou que os genes podem determinar a orientação homossexual. Os pesquisadores crêem que, no máximo, pode haver um componente genético para a sexualidade que, como qualquer outro comportamento, é, sem dúvida, influenciado tanto por fatores biológicos como sociais”.
• O sociólogo Steven Goldberg diz: “Não conheço ninguém da área que argumente que a homossexualidade pode ser explicada sem referência a fatores ambientais”.

Então, parece não haver dúvidas de que, seguindo essa linha reflexiva, sob a ótica científica não existem provas cabais de que a homossexualidade seja adquirida por herança genética. A conclusão mais plausível, portanto, é a que sugere que a orientação homossexual seja resultado da interferência de múltiplos fatores, quais sejam: sociológicos, biológicos, psicológicos e ambientais.

terça-feira, 7 de junho de 2011

A Família de Jesus

Por: Jease Costa

Mateus 12.46-50
“Pois qualquer que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, irmã e mãe” (v.50).

Uma das coisas extraordinárias da experiência cristã é que em Jesus o forasteiro encontra casa, o solitário encontra irmãos e o órfão encontra conforto paternal. A fé que nos liga a Jesus também nos liga ao outro, de forma que a experiência da relação com Deus se manifesta na experiência da relação com nossos irmãos de fé. Quem vai a Jesus encontra um salvador e também uma família de salvos.

O texto acima se refere ao acontecimento de quando a família de Jesus queria falar com ele com o propósito de levá-lo para casa, pois achavam que ele estava exagerando no seu trabalho, uma vez que não encontrava tempo se quer para comer. Marcos diz que seus familiares chegaram a dizer que ele estava perdendo o juízo (Mc. 3.21). Quando chegaram onde Jesus estava mandaram um recado dizendo que o estavam esperando lá fora. A resposta de Jesus foi surpreendente: a minha família é quem faz a vontade de meu Pai que está nos céus! Estaria ele desprezando seus irmãos e sua mãe? É claro que não. O que ele fez foi usar da oportunidade para dar um novo ensinamento aos seus discípulos. O ensinamento de que a fé cristã deve ser desenvolvida em um ambiente de família. Quem comunga da mesma fé está inserido em uma nova comunidade, onde deve prevalecer o espírito fraterno e ser minimizada a solidão. A bem da verdade, a fé bíblica deve ser desenvolvida em comunidade. Na Bíblia não há espaço para a fé solitária. A comunidade dos crentes é uma família de fé, onde se devem promover relacionamentos amorosos e saudáveis, cumprindo a vontade do Pai.

Como está a sua família de fé? O que você tem feito para que ela seja melhor?

terça-feira, 31 de maio de 2011

CINCO AMIGOS

Autor: Franz Kafka

"Somos cinco amigos. Certa vez saímos de uma casa um atrás do outro. Primeiro veio um e se postou ao lado do portão, depois veio, ou melhor, deslizou tão levemente quanto uma bolinha de mercúrio, o segundo, atravessando o portão e postou-se perto do primeiro, então o terceiro, depois o quarto e então o quinto. Por fim, estávamos todos nós de pé, enfileirados. As pessoas nos notaram, apontaram em nossa direção e disseram: 'Os cinco saíram agora dessa casa'. Desde então, vivemos juntos, e seria uma vida pacífica se não houvesse sempre um sexto se intrometendo. Ele não nos faz nada, mas nos incomoda, e isso basta. Por que se intromete onde não é chamado? Nós não o conhecemos e não queremos acolhê-lo. Nós cinco tampouco nos conhecíamos antes e, para falar a verdade, ainda não nos conhecemos hoje, mas o que é possível e tolerado entre nós cinco não é possível nem tolerado com esse sexto. Além disso, nós somos cinco e não queremos ser seis. E qual é o sentido, afinal, dessa contínua comunhão, também entre nós cinco não há sentido, mas agora já estamos juntos e vamos permanecer assim. No entanto, não queremos uma nova agremiação, justamente devido às nossas experiências. Como poderíamos ensinar tudo ao sexto, longas explicações significariam quase uma exceção em nosso círculo, preferimos não explicar nada e não o acolher. Por mais que ele faça bico, empurramo-lo com o cotovelo. Mas mesmo que o empurremos para longe, ele sempre retorna".

Que reflexões podemos fazer nesse texto, aplicando à convivência diária na família, no trabalho, na igreja?

sexta-feira, 20 de maio de 2011

De Volta à Palavra

Por Jease Costa (do livro "Sua Igreja Está No Caminho Certo?")

Quero tratar da necessidade de a igreja hoje voltar à Palavra, fazendo uma análise da reforma espiritual promovida pelo rei Josias no reino de Judá. Essa passagem está registrada nos capítulos 22 e 23 do Segundo Livro dos Reis. Mesmo aquela reforma não sendo uma reforma completa, pois a atitude de obediência não é algo que pode ser imposto com um decreto, não há como negar sua importância na vida do povo de Judá nos dias de Josias. A igreja hoje pode e deve aprender com aquele importante rei da Judéia.


O Encontro

Josias foi um bom rei que procurou fazer o que era reto diante do Senhor, ao contrário de Amon, seu pai, e de seu avô Manassés, que foram reis ímpios e dedicados aos ídolos. Começou a reinar com apenas 8 anos de idade, por volta do ano 640a.C. e no décimo oitavo ano do seu reinado começou os preparativos para iniciar uma reforma no templo. Nesse movimento para a reforma, o sumo sacerdote Hilquias achou o livro da Lei (provavelmente o livro de Deuteronômio) e o entregou ao escrivão Safa, que o leu diante do rei. Ouvindo a leitura do livro, Josias, percebendo que ele e o povo conduziam a vida afastados da vontade de Deus, numa atitude de arrependimento e temor, manda que consultem ao Senhor por ele, pois, dizia ele, “grande é o furor do Senhor que se acendeu contra nós, porquanto nossos pais não deram ouvidos às palavras deste livro, para fazerem segundo tudo quanto de nós está escrito” (II Reis 22:12,13). Daí por diante ele deu seqüência à reforma espiritual que marcou o seu reinado.

É importante notar que essa reforma só foi possível a partir do encontro com a Lei. Não fosse o encontro com a Palavra de Deus, jamais haveria reforma. Deus hoje também está desejoso de operar uma reforma espiritual no meio de sua igreja. No entanto, não haverá reforma sem um encontro sério com a Palavra.

Todo grande movimento sério de avivamento que houve na história da igreja começou com um reencontro com a Palavra. O mesmo pode-se dizer a respeito da Reforma Protestante na Idade Média, liderada por Martinho Lutero, reforma essa que “foi a um tempo reavivamento e revolução” (Timothy George, em “Teologia dos Reformadores”). Da mesma forma que nas épocas antecedentes aos outros períodos de avivamentos, a Reforma também foi precedida de uma época de extrema decadência e frieza espiritual. Quanto a isso, Timothy George diz que “o mal-estar espiritual da baixa Idade Média não foi a causa da Reforma, mas certamente constituiu seu pré-requisito” e faz, em seguida, uma declaração que nos dá condições de entender melhor a condição da igreja pré-reformada:

“Dissemos muito pouco sobre as famigeradas contravenções da igreja pré-reformada: simonia,
nepotismo, mau uso dos benefícios, concubinato clerical, etc. Todos os reformadores, quer ca-
tólicos, quer protestantes, quer radicais, opuseram-se de maneira extrema a essas práticas. En-
tretanto, alguns entre eles também perceberam que era necessário haver algo mais do que um
'pôr a casa em ordem'. Não seria de nenhuma utilidade varrer as teias de aranha se os alicerces
estavam podres. O que se precisava era de uma nova definição da igreja, baseada numa com-
preensão renovada do evangelho”.

Daí podemos saber que a Reforma protestante nasceu da luta pela doutrina da justificação pela fé. Em outras palavras, nasceu a partir de uma releitura da Palavra ou, por assim dizer, nasceu a partir de um reencontro com a Bíblia. A máxima de Lutero era “Sola Scriptura” (Só as Escrituras).

Uma vez que não estamos vivendo um dos nossos melhores momentos na história, onde a igreja pode ser caracterizada pela frouxidão espiritual, pela relativização do pecado e pelos mandos e desmandos de muitos líderes que têm levado muitas ovelhas por caminhos distantes da Palavra do Senhor, está na hora de marcarmos um encontro com a Santa Palavra de Deus. Se o avivamento sucede o declínio espiritual da igreja, então estamos num momento oportuno para a tão esperada reforma. No entanto, como a reforma de Josias, não adianta falarmos em avivamento se não falarmos em um encontro vivo com a Palavra de Deus. Precisamos gastar tempo com ela, estudá-la diligentemente e, até mesmo, metodicamente, mergulhando em suas profundezas, assimilando seus ensinos, saturando-nos com suas palavras.

O estudo da Bíblia não pode ser influenciado pelo ritmo dos tempos modernos. Vivemos a época da velocidade, dos mega-processadores, dos supercomputadores ultravelozes. O homem moderno não tem tempo a perder. Mas, não podemos ter uma relação nesses moldes com a Bíblia. Com ela temos que “gastar tempo”. Parar no tempo serenamente e aprender dela, meditar sobre ela, compreender o que ela tem a nos dizer e saber, através do seu ensinamento, o que Deus quer que sejamos, que façamos e quais são os princípios os quais devem marcar a nossa vida. Lê-la com calma e diligência para sabermos quem somos, quem Deus quer que sejamos, e também quem Ele é. Devemos ser “Maria num mundo de Marta”. A igreja do século 21, se quiser ter o que dizer ao homem moderno, e também a si mesma, precisa marcar um encontro com a Palavra de Deus.


A Confrontação

É claro que a reforma promovida por Josias não foi conseqüência apenas do seu encontro com a Lei. Veja o que diz II Reis 22:11: “Tendo o rei ouvido as palavras do Livro da Lei, rasgou as suas vestes”. A Bíblia de Estudo de Genebra comenta este versículo da seguinte forma: “Josias ficou aflito porque a Lei não estava sendo observada e percebeu que isso desagradava a Deus”.
O rasgar as vestes era símbolo de arrependimento, como comenta a Bíblia Vida Nova:

“Nesta reação se evidencia o efeito da Lei no coração arrependido... As ações do rei demonstram
um verdadeiro arrependimento, o qual rasga o coração e não as vestes. É o arrependimento que
não nasce do formalismo de ir-se à frente em uma reunião pública ou de repetir-se uma oração
lida em um livro”.

O que o rei Josias fez foi confrontar a vida com a Lei e, percebendo o erro, arrependeu-se profundamente. Isto é importante porque não basta conhecer a Palavra se ela não for aplicada ao viver. Não é a Bíblia que deve se submeter ao crivo dos nossos conceitos, mas nossa vida, nossos conceitos, valores e atitudes é que devem se submeter ao crivo da Bíblia. Ela é o gabarito sob o qual a vida deve estar enquadrada. Ela é a autoridade máxima que deve reger todo viver, inclusive a relação com o próprio Deus. Isso porque há muitos que fazem da experiência mística e das emoções o elemento orientador da experiência religiosa. Não se está defendendo aqui uma religiosidade sem a presença de uma experiência espiritual (não estou falando de misticismo!) e sem a presença do aspecto emocional. O que está se defendendo é que toda experiência religiosa e o aspecto emocional, quando houver, devem estar sujeitos à autoridade da Palavra. Por mais real que possam parecer, se contrariarem os princípios bíblicos, devem ser desprezados. Toda vida, toda experiência, todo ato religioso, toda fé, toda doutrina e toda crença devem estar submetidos à revelação das Escrituras.

Talvez hoje esteja faltando essa necessária confrontação da vida e da religiosidade com a Palavra de Deus, com humildade e arrependimento. O problema é que o nosso coração já não dói mais diante da pregação e da leitura que fazemos dela. Parece que agimos como se a pregação não fosse para nós, e sempre achamos que “outros deveriam estar aqui para ouvir isso”. É necessário entendermos que a Bíblia é sempre pessoal. Ela diz a nós, pois é para nós. Ela não é apenas para “os do mundo”, é também para a igreja. A propósito, a maior parte das palavras proféticas, mesmo suas repreensões mais severas, foram dirigidas ao próprio povo de Deus, e todas as epístolas do Novo Testamento foram endereçadas às igrejas cristãs, ou seja, aos crentes, aos que já haviam tido uma experiência de conversão ao Senhor.

Apesar de tudo, sou otimista! Eu ainda acredito na possibilidade de uma reforma. Acredito que ainda diremos muito ao homem do terceiro milênio da era cristã, mas enquanto nos recusarmos a confrontar nossa própria vida com a Palavra de Deus, acho que teremos que esperar um pouco mais. Queira Deus que estejamos dando início a um novo tempo em que Seu povo tenha o coração totalmente dominado por Sua Palavra!

O Ajuste

A reforma de Josias obedeceu a um processo lógico. Não bastava ele ter encontrado o Livro da Lei e fazer a confrontação com a vida se não houvesse disposição para fazer os ajustes. Era necessário conhecer a Lei, assim como confrontar-se com ela, mas era imprescindível aceitar ser moldado por ela. II Reis 23:1-4 diz qual foi a atitude do rei:

“Então, deu ordem o rei, e todos os anciãos de Judá e Jerusalém se ajuntaram a ele. O rei subiu à Casa do Senhor, e com ele todos os homens de Judá, todos os moradores de Jerusalém, os sacerdotes, os profetas e todo o povo, desde o menor até ao maior, e leu diante deles todas as palavras do Livro da Aliança que fora encontrado na Casa do Senhor. O rei se pôs em pé junto à coluna e fez aliança ante o Senhor, para o seguirem, guardarem os seus mandamentos, os seus testemunhos e os seus estatutos, de todo o coração e de toda a alma, cumprindo as palavras desta aliança que estavam escritas naquele livro. E todo o povo anuiu a esta aliança.
Então o rei ordenou ao sumo sacerdote Hilquias e aos sacerdotes da Segunda ordem e aos guardas da porta que tirassem do Templo do Senhor todos os utensílios que se tinham feito para Baal, e para o poste-ídolo, e para todo o exército dos céus, e os queimou fora de Jerusalém, nos campos de Cedrom, e levou as cinzas deles para Betel”.

Assim que Josias compreendeu o que Deus esperava dele e de todo povo, não hesitou em ajustar-se à Lei. Conclamou o povo, leu para ele o livro encontrado e, após todos também concordarem em obedecer às palavras daquele livro, deitou fora tudo o que Deus abominava. Josias corrigiu a vida, consertou o que estava errado, colocou o caminho na pauta de Deus.

Acredito que causaríamos maior influência no mundo, como igreja, se a palavra pregada para que outros se convertam, convertesse primeiro o nosso próprio coração. No ano de 1986, morando na cidade de Chapecó, no Oeste de Santa Catarina, eu e mais alguns irmãos de outras denominações evangélicas fazíamos um trabalho com os menores internos da FUCABEM (Fundação Catarinense do Bem-Estar do Menor). Em uma das reuniões de planejamento um dos integrantes do nosso grupo interrompeu a reunião subitamente e fez uma pergunta que nitidamente o incomodava. A pergunta foi: “A Bíblia é um livro revolucionário?” Todos nós, evidentemente, respondemos que “sim!”, mas parecia que ele não nos ouvia e perguntou de novo: “A Bíblia é um livro revolucionário?” Ao que respondemos da mesma forma. Aí, ele fez outra pergunta: “Então, por que é que nós, os cristãos, ainda não revolucionamos o mundo?” Como esta é uma pergunta complexa, a resposta também o é. Mas, ao final, todos nós concordamos que talvez ainda falte aos cristãos serem, eles mesmos, revolucionados pela Palavra.

O Coração Em Chamas

É muito importante salientar nessa caminhada dos discípulos de Emaús com Jesus que, mesmo com eles perdendo de vista a missão, juntamente com tudo o que a ela estava envolvido em função da suposta morte do Mestre, o Senhor insistia em lhes expor as Escrituras. É maravilhoso percebermos na revelação bíblica que Deus nunca deixou o Seu povo sem Sua Palavra. Sempre houve homens usados pelo Senhor para ensinar ou fazer o povo relembrar da Sua Lei, desde Moisés, passando pelos Juízes, depois pelos profetas anteriores, pelos profetas posteriores, inclusive no cativeiro, com Ezequiel na Babilônia, e com Jeremias em Jerusalém. Foi assim no período da restauração, quando Deus levantou homens zelosos por sua Lei e que procuravam redirecionar o povo na vontade do Senhor, como é, por exemplo, o caso de Esdras, e, mais adiante também no chamado período interbíblico, quando um grupo se levantou contra a helenização, não aceitando ter que deixar de prestar culto a Deus para prestar culto aos deuses gregos, como é o caso do grupo liderado pelos Macabeus, que promoveu uma importante e vitoriosa revolta, conquistando de volta aos judeus o direito de servirem livremente ao seu Deus.

Apesar desse esforço da parte de Deus em jamais deixar Seu povo sem Sua Palavra, infelizmente nem sempre Sua Palavra foi bem recebida. Houve momentos de grande arrependimento. No entanto, houve outros de grande indiferença e frieza, em que a Palavra era anunciada e os corações permaneciam duros e insensíveis. No caso dos discípulos de Emaús não foi assim que aconteceu. Após Jesus partir o pão, abençoá-lo e repartí-lo, “então se lhe abriram os olhos e o reconheceram, mas ele desapareceu da presença deles. E disseram um ao outro: Porventura não nos ardia o coração quando ele, pelo caminho, nos falava, quando nos expunha as Escrituras?” (Lc 24:31, 32). Que maravilha! Apesar de tudo, as Escrituras ainda faziam seus corações arder. Ainda estavam sensíveis a elas. Elas ainda os comoviam. No entanto, diferentemente, temos vivido um tempo em que a igreja não tem ouvido com esta mesma sensibilidade a Palavra de Deus. Vivemos tempos de indiferença, onde os corações não ardem mais diante do falar do Senhor. Isso não só por parte dos ouvintes, mas também por parte de quem prega. Só haverá esperança de que a Palavra irá fazer o coração do povo arder quando fizer arder primeiro o coração de quem prega. Mas parece que estamos todos cauterizados, calejados, e já não dói mais. Para alguns pregadores a Bíblia não é mais um instrumento de vida, apenas de trabalho. Alguém já disse que muitos sobem ao púlpito não porque têm algo a dizer, mas porque têm que dizer algo.

Estamos carentes de homens e mulheres que voltem a se comover com a Palavra de Deus, tendo a mesma reação do rei Josias, que rasgou as suas vestes humilhado e mandou consultar ao Senhor por ele. Precisamos de homens e mulheres que voltem a chorar diante da Palavra, a cair em prantos quando perceberem a gravidade dos seus pecados. Que ainda sejam capazes de se comoverem de emoção ao olharem para a cruz nas páginas da Bíblia e, não como produto de uma emoção barata, mas de uma reação sincera que deveria ser próprio de quem contempla a amplitude do amor de Deus, que caiam prostrados com o rosto em terra em atitude de devoção e consagração ao Autor da vida. Que a Palavra de Deus volte a deixar nossos corações em chamas!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

HOMOS-SEXUS / O QUE A BÍBLIA DIZ SOBRE A HOMOSSEXUALIDADE



INTRODUÇÃO DO LIVRO (lançamento em junho pela Abba Press - www.abbapress.com.br)

Há temas sobre os quais é sempre válida uma nova abordagem, tanto à guisa de informação quanto de proporcionar novas oportunidades de reflexão a partir de um outro olhar. E um desses temas é certamente o da homossexualidade.

O termo homossexual é formado pela junção de uma palavra de origem grega (homos = igual) com outra que vem do latim (sexus = sexo), e significa “igual no sexo”, em referência à preferência, ou atração sexual, por parte de uma pessoa (embora também ocorra entre animais), seja homem ou mulher, por outra do mesmo sexo. À homossexualidade feminina é dado o termo de lesbianismo ou safismo, em referência à ilha grega de Lesbos, um importante centro cultural onde vivia a poetisa Safo, entre os séculos VI e VII a.C, cujos poemas, muito admirados, cantavam o amor e a beleza em sua maioria dirigidos às mulheres. Já o termo gay ao longo do tempo tem adquirido um caráter mais político do que comportamental, cabendo aos “movimentos gay” a tarefa de lutar pelos direitos dos homossexuais por meio de eventos, como, por exemplo, a Marcha Gay, ou através de suas associações e organizações políticas que têm grande poder de influência nos vários mecanismos políticos, sociais e de comunicação de massa.

Por conta dos movimentos gay e da mídia esse tema tem sido trazido à tona com extrema regularidade, principalmente em face da chamada “Lei da Homofobia”, através da qual os homossexuais pretendem garantir principalmente o direito de serem aceitos na sociedade livres de toda sorte de preconceitos e hostilidades. E é justamente aí que entra a igreja. Ela tem sido acusada de ser homofóbica por tradicionalmente não concordar com a homossexualidade, e alguns de seus líderes já sofreram processos judiciais antes mesmo de a lei ser aprovada, como foi o caso do pastor luterano Ademir Kreutzfeld que, no ano de 2006, foi processado por homofobia pelo ativista gay responsável pelo jornal O Tropeiro, da cidade de Rancho Queimado, em Santa Catarina, porque preocupado com a promoção da homossexualidade feita em uma matéria do jornal, questionou os comerciantes locais a respeito do patrocínio dado àquele tipo de reportagem.

Em razão disto, entre outras coisas, penso que a igreja deve se posicionar a respeito da homossexualidade com base em um conceito mais elevado do ser humano e a partir de uma leitura contextualizada da Palavra de Deus sem, entretanto, ter que abrir mão dos valores absolutos que devem nortear sua vida, sua caminhada e sua conduta em relação ao indivíduo e aos temas que dizem respeito ao mundo em que ela está inserida. Sendo assim, é útil também perguntar qual é a proposta que o cristianismo oferece ao homossexual.

Devo admitir que apresentar uma resposta objetiva e cabal pode incidir no erro de se supor que quem a responde tem a interpretação definitiva do texto bíblico e da questão homossexual. É por isso que este livro pretende apresentar uma proposta cristã, considerando que ela parte de uma linha de interpretação da forma como o cristianismo compreende a temática da homossexualidade. Embora a premissa deste livro seja a partir de uma proposta, isso não significa que não se procurou dar consistência bíblica e teológica à argumentação. A linha interpretativa do texto bíblico aqui desenvolvida caminha pela via da ortodoxia cristã, porém o indivíduo, seus sentimentos e sua história não são deixados de lado, o que inevitavelmente interfere nos caminhos para os quais as propostas apresentadas apontam.

Este livro não tem a pretensão de trazer algo novo sobre a homossexualidade, até porque penso que esse conceito está um tanto desgastado. É muito comum o uso da frase: “de acordo com as novas pesquisas sobre a homossexualidade...”, e a partir daí se desenvolver um discurso como se estivessem trazendo à lume algo absolutamente novo sobre este tema. A bem da verdade, o que eu percebo é que o que se encontrou foram apenas novas formas de se defender as mesmas antigas teses ainda em cima de muitas conjeturas tanto da parte dos que são a favor da homossexualidade quanto dos que lhe são contrários, embora esses últimos com menor consistência, admitindo-se que os defensores da causa homossexual investiram em uma nova forma de abordagem em que se procurou dar maior fundamentação científica à questão ou uma interpretação bíblica primando por maior consistência histórico-textual, embora essa consistência não signifique necessariamente precisão porque, para isso, vai depender da chave hermenêutica adotada. Nesse quesito, os que têm posicionamento contrário à homossexualidade nem sempre têm elevado o nível da abordagem, ficando em muitos casos ainda reféns de uma argumentação ultrapassada, permeada pela intolerância e pelo preconceito em relação ao indivíduo homossexual.

Também é importante que se diga que esta obra não é um tratado científico sobre a homossexualidade, não tem a pretensão de colocar um ponto final na discussão e nem objetiva promover um debate acadêmico sobre o assunto, pelo simples fato de que sua proposta não é científica nem acadêmica, mas pastoral. Por isso, é importante que o leitor a leia considerando esse propósito em particular, pois o que se pretende aqui é oferecer uma contribuição mais pragmática e menos teórica ou conceitual, levando sempre em conta o indivíduo, mas sem abrir mão do que a Palavra revelada de Deus tem a dizer. É esse o esforço empreendido.

É possível que a proposta deste livro apresentada aqui esteja muito acima do que o seu conteúdo seja capaz de alcançar, e com toda certeza, ao mesmo tempo em que poderá agradar a alguns, também desagradará a outros. Porém, se provocar no leitor que não é homossexual a abertura de uma janela por mínima que seja em sua mente e em seu coração que lhe dê a possibilidade de reler o indivíduo homossexual de forma mais justa e humana, e no leitor de orientação homossexual, se for o caso, algum vislumbre a mais a respeito de si mesmo sob a ótica do evangelho e do propósito de Deus aqui apresentado para sua vida, já terá sido útil. Entretanto, mesmo que isso não ocorra, mas se servir pelo menos para avaliação e reafirmação de conceitos preestabelecidos, ainda assim terá valido a pena.

Jease Costa

O Projeto de Deus Com a Ressurreição de Jesus

Por Jease Costa (Usado do meu livro "Sua Igreja Está No Caminho Certo?", publicado pela Abba Press. Usado com permissão)

A ressurreição de Jesus tornou possível um grande projeto de Deus. Ao lermos a Bíblia, vemos o trabalho de Deus para aproximar-se do seu povo. No Antigo Testamento temos um Deus relativamente distante. Não eram todos que recebiam o Seu Espírito; não eram todos que O ouviam falar diretamente, e não eram todos que podiam entrar em Sua presença. Presença essa que, em alguns casos, causava verdadeiro temor e tremor. Lembra-se de quando Moisés subiu ao Sinai para receber a Lei? Veja bem o que o texto diz:

“E o Senhor disse a Moisés: vá ao povo e consagre-o hoje e amanhã. Eles deverão lavar as suas vestes e estar prontos no terceiro dia, porque nesse dia o Senhor descerá sobre o monte Sinai, à vista de todo o povo. Estabeleça limites em torno do monte e diga ao povo: tenham o cuidado de não subir ao monte e de não tocar na sua base. Quem tocar no monte certamente morrerá; será apedrejado ou morto a flechadas. Ninguém deverá tocá-lo com a mão. Seja homem, seja animal, não viverá. Somente quando a corneta soar um toque longo eles poderão subir ao monte... Ao amanhecer do terceiro dia houve trovões e raios, uma densa nuvem cobriu o monte, e uma trombeta soou fortemente. Todos no acampamento tremeram de medo” (Ex 19:10-16).

Percebemos, também, a distância de Deus em relação aos seu povo nas funções dos sacerdotes e dos sumo-sacerdotes. Eles eram intermediários entre o povo e Deus. Os sacerdotes recebiam as ofertas do povo para o sacrifício, e mais específicas ainda eram as funções do sumo-sacerdote. Só ele podia entrar no lugar santíssimo, que era o símbolo do lugar mais próximo de Deus no tabernáculo, e mais tarde no templo. Ele entrava lá apenas uma vez por ano, e também entrava com medo de morrer. Era assim. O povo não podia entrar e quem podia entrava com medo. Mas Deus não queria isso. Seu grande projeto era habitar no coração de Seus filhos, e esse projeto só poderia ser concretizado na pessoa do Cristo ressurreto. O apóstolo João diz em seu prólogo: “Aquele que é a Palavra tornou-se carne e viveu entre nós. Vimos a sua glória, glória como do Unigênito vindo do Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1:14).

A encarnação de Cristo foi o primeiro passo para a aproximação. Primeiro Deus está lá no monte, o monte fumega, tem raios e trovões, e ainda quem se aproxima morre. Com a encarnação de Jesus o quadro já muda. Ele não está mais no monte. Ele desce do monte e constrói seu tabernáculo, ou sua casa, ao lado da nossa e vive entre nós. Agora Ele já caminha conosco, podemos vê-Lo, ouvi-Lo e até mesmo tocá-Lo.

Isso foi realmente um grande acontecimento, mas ainda não bastava, até porque essa presença não poderia ser para sempre. Um dia não O teríamos mais presente fisicamente conosco. Ele teria que morrer. Porém Ele queria aproximar-Se ainda mais. Ele não queria apenas viver entre nós, Ele queria viver em nós e para isso teria que cumprir mais uma etapa nesse processo do grande projeto do Pai. A última etapa era a ressurreição.

“Depois do sábado, tendo começado o primeiro dia da semana, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro. E eis que sobreveio um grande terremoto, pois um anjo do Senhor desceu dos céus e, chegando ao sepulcro, rolou a pedra da entrada e sentou-se sobre ela. Sua aparência era como um relâmpago, e suas vestes eram brancas como a neve. Os guardas tremeram de medo e ficaram como mortos. O anjo disse às mulheres: Não tenham medo! Sei que vocês estão procurando Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui; ressuscitou, como tinha dito. Venham ver o lugar onde ele jazia” (Mt 28:1-6).

Agora, o grande projeto de Deus estava consumado. Jesus estava vivo e a partir de agora, por meio do Espírito Santo, faria do coração dos seus discípulos o lugar da Sua morada. A perda da visão da ressurreição de Cristo significa a perda da visão de Sua presença real em nossos próprios corações! Parece-me que entramos em um novo século, esquecidos de que o lugar que Ele quer habitar é o nosso coração. Acho que estamos vivendo os tempos de Laodicéia. Muitos recursos, poder e possibilidades, mas Jesus está do lado de fora. Vejam o que Ele diz àquela igreja: “Você diz: Estou rico, adquiri riquezas e não preciso de nada. Não reconhece, porém, que é miserável, digno de compaixão, pobre, cego e que está nu... Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei e cearei com ele, e ele comigo” (Ap 3:17-20). Está na hora da igreja atender àquEle que bate à porta. Não é bom deixá-Lo do lado de fora. Ele é o Messias que liberta o nosso coração das cadeias do pecado e Suas palavras, que são verdadeiras, nos inserem em um novo padrão de vida. Seu poder continuará operando em nossos corações e em nossas vidas. Nossa missão agora tem novo significado e, dessa forma, Ele vivo e ressurreto, torna-se acima de todo homem, poder ou potestade, fazendo-Se digno de toda honra, glória, adoração e louvor.

Eia, levantemo-nos e andemos! O nosso Senhor está vivo! Temos um trabalho a fazer e Ele está ao nosso lado e, por certo, segurará as nossas mãos e nos dará poder para vencer. Ainda temos um Messias; Ele é, de fato, o Cristo de Deus. Portanto, podemos manter firme a nossa fé nEle que nos dará a vitória e seremos bem sucedidos. A partir de agora podemos andar com Ele em uma comunhão profunda de amor e, por causa disso, como igreja, somos o verdadeiro templo do Senhor.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Igreja: Um Povo Marcado Pela Cruz

Por Jease Costa (Retirado do meu livro "Sua Igreja Está No Caminho Certo?", pela editora Abba Press)

A igreja deve ser marcada pela cruz. Na verdade, ela jamais deveria perder de vista a centralidade da cruz. A cruz deveria sempre ocupar um lugar de proeminência na sua vida, obra e pregação. Mas, infelizmente, com o passar do tempo, ela foi perdendo de vista a cruz de Cristo e a imagem está agora distante, já um pouco embaçada pela névoa da indiferença para com aquele sacrifício que tornou possível o seu resgate e a sua existência como povo, como igreja, e que deu o significado da sua vocação.

Uma vez que a igreja deve estar centrada na cruz, ela deve também ser marcada por ela. E a primeira marca, das que quero abordar, é a marca da "abnegação". Ao olhar para a cruz vemos a abnegação encarnada naquele que estava pregado nela, e isso deve interferir profundamente na vida dos que são chamados seus discípulos. Em Marcos 8:34 Jesus diz: “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me”. Os romanos obrigavam os condenados a levarem a própria cruz (mais precisamente o “braço” da cruz) até o local da execução. O Dr. Stott, no livro “A Cruz de Cristo”, citando H. B. Swete, diz: “Tomar a cruz e seguir a Jesus ‘é colocar-se na posição de um condenado a caminho da execução’”. Isto significa dizer que uma das marcas que a cruz deve deixar na igreja é a marca da morte. Não a morte física nem a morte da condenação eterna, pois esta a cruz aniquilou, mas a morte do eu, do egocentrismo. É a morte para a vontade e querer próprios. Nossa vida, sonhos e destino não deverão mais ser determinados pelo nosso próprio querer, pois agora há uma outra lei e autoridade sob a qual tudo o que chamamos “nosso” deverá estar sujeito. A igreja de Cristo deve ser uma comunidade povoada por homens e mulheres dispostos, a cada dia, a levar a própria cruz, ou, por assim dizer, dispostos a morrer cada dia um pouco mais para o “eu”, a fim de que possa ser, como seguidora do Senhor, instrumento em Suas mãos para completar a Sua Obra, identificando-Se com seu Senhor. Se a cruz deve estar no centro da vida da igreja, está por causa daquele que estava nela, e Ele deu o maior exemplo de abnegação para os seus seguidores em sua oração no Getsêmani, quando se aproximava da Sua hora: “Meu Pai, se é possível, passe de mim este cálice; todavia não seja como eu quero, mas como tu queres” (Mt. 26:39).

Uma segunda marca que a cruz deve deixar na igreja é a marca da "autocompreensão". A cruz tem lentes, lentes macroscópicas que nos fazem enxergar melhor. E uma das coisas que a igreja pode ver melhor através da cruz é a si mesma, pois, além de nos dar condições de perceber a origem divina de nossa vocação, ela nos dá uma visão mais clara da nossa dimensão humana, ou seja, ela nos faz visualizar nossas limitações impostas pela nossa humanidade. A experiência com o Cristo da cruz, se por um lado nos torna melhores humanos, por outro não nos torna menos humanos. A igreja não é uma comunidade de supra-humanos, mas de pessoas, de homens e mulheres que, muito embora salvos e redimidos, continuam com todas as limitações da condição humana. Isto quer dizer que ela continua sujeita a falhas, pecados e até mesmo a todas as dores a que estão sujeitas todas as pessoas. A cruz nos mostra isso no fato de que foi justamente por causa dessa nossa humanidade decaída que Cristo veio a morrer. A falta dessa compreensão tem causado muitos estragos. Muito embora afirmemos que a igreja deve ter um comportamento santo, não estamos querendo dizer que um crente jamais cometerá pecados, mas que ele deve sempre buscar um viver cada vez mais santificado. No entanto, mesmo assim, é provável que falhará, e isso porque está preso à sua humanidade decaída. Quanto a isto, a igreja, teoricamente, concorda, mas quando um dos seus cai, ela geralmente age de forma aniquiladora, muitas vezes não se importando se houve ou não arrependimento. Não estou querendo dizer que não deva haver disciplina. É claro que deve, mas o alvo da disciplina é sempre a restauração. Disciplinar significa ensinar, instruir com o objetivo de corrigir, formar ou reformar o caráter. Disciplinar não é cortar fora, aniquilar, matar. Disciplinar tem a ver com vida e não com morte. O texto de Isaías 42 fala a respeito da vinda do Servo do Senhor, do papel que deveria cumprir e dos métodos que deveria adotar. O verso 3 diz: “não quebrará o caniço rachado, e não apagará o pavio fumegante. Com fidelidade fará justiça”. Este é um texto messiânico e Jesus é identificado como sendo esse Servo. Note como ele fará a justiça: “não quebrará o caniço rachado nem apagará o pavio fumegante”. É bem mais fácil quebrar e arrancar fora a cana rachada e conseqüentemente envergada, do que colocar um suporte para que se firme outra vez. É mais fácil apagar de uma vez o pavio da lamparina que está fumegando do que colocar mais óleo para que volte a iluminar. O papel do servo do Senhor é restaurar e não arrancar fora. No entanto, em muitos casos, a igreja hoje tem andado em caminho contrário ao que anda o seu Senhor. Ao invés de colocar suporte, ela tem quebrado e arrancado as vidas rachadas e envergadas pelos pecados e misérias humanas e, ao invés de alimentar com o óleo, ela tem apagado de vez muitas vidas que poderiam estar ainda brilhando. A cruz nos dá visão da nossa humanidade não para sermos complacentes com o erro e o pecado, mas para sermos mais humildes e misericordiosos, pois ela nos mostra também que somos todos iguais e sujeitos às mesmas paixões e fraquezas e, conseqüentemente, totalmente dependentes da Graça daquEle que nela morreu.

Outra marca da cruz que a igreja deve carregar é o "amor sacrificial". Até porque amor sem sacrifícios não é amor, e a cruz é a expressão mais forte e contundente desse amor. Amor que doa e que se doa sem reservas. Amor por Deus como resposta ao Seu amor por nós, e amor ao próximo como resposta do nosso amor por Deus. Quando olhamos para a cruz, não vemos mais um homem pregado nela. Vemos o amor no seu mais belo fulgor. Quando olhamos para aquelas mãos e pés perfurados com pregos, não vemos mais sangue escorrendo. Vemos o amor vazando daqueles poros, encharcando o chão do calvário e, por fim, inundando toda a terra, todo o cosmos, buscando penetrar todos os nossos corações. E uma vez alcançando os nossos corações, converte-nos a que também amemos. Às vezes percebemos um esforço tremendo em nossas igrejas para a aquisição de bens de todos os gêneros, mas bastaria à igreja saber que o bem maior que ela deve ter é a capacidade de amar. Uma igreja que não ama perde a razão de ser e se torna estéril, pois só o amor pode produzir vida; e a igreja deve ser celeiro de vida. Esse amor é tão importante para a igreja que até mesmo os dons espirituais só fazem sentido num ambiente em que ele está inserido. Leia com atenção, e como se você só estivesse conhecendo agora, o que o apóstolo Paulo diz a respeito do amor em sua primeira carta à igreja de Corinto, no capítulo 13:


“Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o sino que ressoa ou como o prato que retine. Ainda que eu tenha o dom de profecia e saiba todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé capaz de mover montanhas, se não tiver amor, nada serei. Ainda que eu dê aos pobres tudo o que possuo e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada disso me valerá.
O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor. O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
O amor nunca perece, mas as profecias desaparecerão, as línguas cessarão, o conhecimento passará. Pois em parte conhecemos e em parte profetizamos; quando, porém vier o que é perfeito, o que é imperfeito desaparecerá. Quando eu era menino falava como menino, pensava como menino e raciocinava como menino. Quando me tornei homem deixei para trás as coisas de menino. Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então conhecerei plenamente, da mesma forma que sou plenamente conhecido.
Assim, permanecem agora estes três: a fé, a esperança e o amor. O maior deles, porém, é o amor”.


E a última marca da cruz que quero abordar aqui, das que a igreja deve ter, é a "alegria". Isso parece uma tremenda contradição, pois a cruz é um lugar de horror, punição severa e cruel para malfeitores e rebeldes e, muito embora nosso Senhor não houvesse sido malfeitor nem rebelde, foi esmagado cruelmente nela. Como, então, ela pode marcar a igreja com alegria? A alegria não é pelo horror nela exposto, mas por causa dos seus resultados: o perdão, a propiciação, a justificação, a paz com Deus e, por fim, a garantia da salvação eterna. Com tudo isso, como não estar com o coração cheio de regozijo e transbordante de graça? Os resultados da cruz não enchem apenas o nosso coração de alegria, mas também o coração de Deus. Ele alegra-se ao ver Seus filhos alegres. No entanto, participamos de cultos em algumas igrejas que parece até que o sorriso é coisa proibida e má. Não há alegria, não há festa, não há cânticos de júbilo. O salmista, no Salmo 100, conclama o povo a “celebrar com júbilo ao Senhor” e a “servir ao Senhor com alegria”. O livro do profeta Isaías, em mais outra passagem messiânica, no capítulo 61, e falando das funções do Messias, diz: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor ungiu-me para levar boas novas aos pobres... e dar a todos os que choram em Sião uma bela coroa em vez de cinzas, óleo de alegria em vez de pranto, um manto de louvor em vez de espírito deprimido” (Vss 1-3). Era esse o papel do Cristo: trazer alegria aos deprimidos. E o lugar onde Ele concluiria Sua Obra era a cruz. Portanto, apesar do horror e da dor a que foi submetido nosso Senhor, a cruz deve marcar o povo de Deus com a alegria de Deus.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Qual seria a resposta cristã à morte de Bin Laden?

Extraído de: http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=42894


"Fico feliz que Osama bin Laden tenha deixado o mundo. E rezo para que a sua partida possa levar à paz. Mas, como cristão e norte-americano, é-me pedido que eu reze por ele e, em algum momento, lhe perdoe."

A opinião é do jesuíta norte-americano James Martin, editor de cultura da revista dos jesuítas dos EUA, America. Martin é autor de best-selllers dos EUA como My Life with the Saints [Minha vida com os santos] (2006) e The Jesuit Guide to (Almost) Everything: A Spirituality for Real Life [O guia jesuíta para (quase) tudo: Uma espiritualidade para a vida real] (2010). O artigo foi publicado no blog da revista America e no sítio The Huffington Post, 02-05-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Como alguém que trabalhou no "Ground Zero" nos dias e semanas após o 11 de setembro me alegrei ao ouvir que o longo reinado de terror de Osama Bin Laden, que havia distribuído morte, destruição e miséria indescritível a milhões de pessoas em todo o mundo, tinha finalmente chegado ao fim. Como cristão, no entanto, não posso me regozijar com a morte de um ser humano, independentemente de quão monstruoso ele fosse.

Na manhã do dia 11 de setembro de 2001, eu estava trabalhando no meu escritório da revista America em Manhattan. Minha mãe, que vive na Filadélfia, me telefonou para me dizer que um avião havia atingido o World Trade Center. Quando eu corri para fora do meu escritório e olhei para a Sixth Avenue, pude ver as torres queimando, com uma fumaça preta como tinta escorrendo dos seus topos. As sirenes já estavam estridentes, e homens e mulheres estavam correndo pelas ruas chorando, tentando freneticamente fazer chamadas em telefones celulares para seus entes queridos.

Os poucos dias seguintes foram um borrão horrível para mim e para todos os nova-iorquinos. Para todos os norte-americanos. Na noite do 11 de setembro, eu trabalhei no Chelsea Piers, em Nova York, juntamente com bombeiros, socorristas e capelães. Aguardávamos sobreviventes, que nunca vieram. Na manhã e na tarde do dia 12 de setembro, eu me sentei com membros de famílias estarrecidos em uma grande sala da New School no centro de Manhattan, lendo com atenção as listas de sobreviventes do hospital, dos quais havia quase nenhum.

Então, no dia 13 de setembro, enquanto eu estava trabalhando no Chelsea Piers, um oficial de polícia me ofereceu uma carona ao Ground Zero, então chamado simplesmente de "o lugar". Lá, eu passei os próximos dias e semanas, em meio às minhas atribuições no trabalho e junto com outros jesuítas, ministrando aos funcionários do resgate, entre os destroços fumegantes e fedorentos, em alguns lugares ainda em chamas, antes da vala comum.

Caminhávamos sobre a imensa quantidade de detritos dos ataques, rezávamos com os bombeiros que perderam amigos, aconselhávamos socorristas que haviam visto coisas horríveis, celebrávamos a missa sobre os escombros, e saíamos cobertos de poeira cinzenta do Ground Zero todos os dias.

Por isso, eu não sou cego diante da morte e da destruição causadas por Osama bin Laden.

No entanto, os cristãos estão no meio do período da Páscoa, quando Jesus, o inocente, não só ressuscitou triunfante dos mortos, mas, na sua vida terrena, perdoou seus algozes na cruz, em meio a dor excruciante. O perdão é o mais difícil de todos os atos cristãos (o amor, em comparação, é mais fácil). Também é, de acordo com Jesus, algo que se entende não ter limite. Sem fronteiras.

Pedro lhe perguntou quantas vezes ele deveria perdoar. Sete vezes? "Não sete vezes", respondeu Jesus, "mas, digo-vos, até setenta vezes sete". Em outras palavras, vezes sem conta. "Perdoe seu irmão ou irmã do fundo do seu coração", disse ele. Isso não é negar o lugar do julgamento e da justiça aos olhos de Deus, pois tal negação significaria que acreditamos em um Deus que não se interessa pelos assuntos humanos. Mas o julgamento e a punição, diz Jesus, cabem a Deus.

Então, a questão é se o cristão pode perdoar um assassino, um assassino em massa, até mesmo – como no caso de Osama bin Laden – um coordenador de assassinatos em massa ao redor do globo. Eu não tenho certeza se eu seria capaz de fazer isso, especialmente se eu tivesse perdido um ente querido. Mas, assim como com outras questões de "vida", não podemos ignorar o que Jesus pede de nós, por mais difícil que seja para compreender. Ou para fazer.

Porque essa é uma questão de "vida" assim como qualquer outra. O cristão não é simplesmente em favor da vida para o nascituro, para o inocente, para aqueles com quem nos importamos, para nossas famílias e amigos, para os nossos concidadãos, para os nossos companheiros da Igreja ou até mesmo para aqueles que consideramos com bons, mas sim para todos. Toda vida é sagrada, porque Deus criou toda a vida. É isso que está por trás do mandamento mais difíceis de Jesus: "Eu vos digo: amai os vossos inimigos e rezai pelos que vos perseguem".

Também é isso o que está por trás da declaração do Vaticano de hoje, que equilibra o desejo por um fim ao terror com a santidade da vida, independentemente de quão odiosa seja a pessoa: "Osama bin Laden, como todos sabemos, teve a gravíssima responsabilidade de difundir divisão e ódio entre os povos, causando a morte de inúmeras pessoas, e de instrumentalizar as religiões para esse fim. Frente à morte de um homem, um cristão não se alegra jamais, mas reflete sobre a grave responsabilidade de cada um diante de Deus e dos homens, e espera e se empenha para que todos as situações não sejam ocasião para um maior crescimento do ódio, mas sim da paz".

E está por trás do ato mais cristão do Papa João Paulo II, beatificado no mesmo dia em que Osama bin Laden foi morto. Talvez a confluência de eventos seja providencial. Como alguém que viveu sob o nazismo e o comunismo, João Paulo não era indiferente ao terror ou aos assassinatos. Mas ele também era um cristão que conhecia a centralidade do perdão, mesmo para os crimes mais graves.

Em 1980, ele foi vítima de uma tentativa de assassinato por Mehmet Ali Agca, um ultranacionalista turco. Um dos primeiros atos do Beato João Paulo II após a sua recuperação foi viajar até a cela de Agca na cadeia e oferecer-lhe a valiosa graça do perdão.

Osama bin Laden foi o responsável pelo assassinato de milhares de homens e mulheres nos Estados Unidos, pelas mortes e pela miséria de milhões de pessoas em todo o mundo, e pela morte de muitos soldados homens e mulheres, que fizeram o sacrifício supremo de suas vidas. Fico feliz que ele tenha deixado o mundo. E rezo para que a sua partida possa levar à paz.

Mas, como cristão, é-me pedido que eu reze por ele e, em algum momento, lhe perdoe. E esse mandamento nos vem de Jesus, um homem que foi espancado, torturado e morto. Esse mandamento vem de um homem que sabe muito sobre o sofrimento. Ele também vem de Deus.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

UM ABRAÇO NUNCA É TARDIO

Por: Israel Belo de Azevedo
www.prazerdapalavra.com.br

Meus amigos estão ficando velhos, o que quer dizer que eu também estou. (Se já não fiquei.)
Em 1977, fui ao primeiro aniversário do filho de um amigo. Dois meses depois, tive que comparecer ao funeral desse menininho. Meu amigo, pastor, tirando forças que só um crente sabe da onde, pregou que Deus lhe dera um filho, Deus lho tirara e bendizeu o nome de Deus, como Jó.
Muitas vezes conversamos, mas ele nunca falou do filho que lhe fora inexplicavelmente retirado.
Muitas vezes caminhamos juntos, mas eu nunca lhe perguntei sobre o bebê definitivamente levado.
Eis que 34 anos depois, meu amigo fala publicamente de sua dor. E se tranca no seu merecido silêncio.
Onde estive que ele não pôde chorar comigo?
Que vida vivi que não lhe percebi o vazio?
Que escolhas me levaram para longe do coração do meu querido.
Meu irmão, eu lhe devo um abraço.
Você ainda o aceita?

E tudo isto demanda coragem!

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Revendo nosso padrão de justiça

Por: Jease Costa


1 Samuel 30.21-25
“E quem vos daria ouvidos nisso? Pois qual é a parte dos que desceram à batalha, tal será também a parte dos que ficaram com a bagagem; receberão partes iguais’ (v.24).

Foi esse o conceito de justiça aplicado por Davi ao voltar vitorioso da guerra. Um grupo foi à batalha e outro, cansado, ficou guardando a bagagem. Ao voltar com o despojo, que eram os bens saqueados dos inimigos vencidos, mesmo contrariando alguns, Davi o repartiu em partes iguais com todos.

Parece injusto, não é mesmo? Não seria mais correto dar maior gratificação aos que se esforçaram e lutaram no campo de batalha, em detrimento dos que ficaram descansando?

Isso nos faz rever nosso conceito de justiça. O propósito da justiça não é privilegiar uma elite definida por sua bravura, competência ou destemor, mas garantir o bem comum, considerando que nem todos têm as mesmas qualificações, mas que todos são necessários na abrangência dos seus limites, mesmo que seja apenas para ficar “guardando a bagagem dos que foram lutar”.

A aplicação da justiça também tem a ver com a inclinação moral de quem tem o dever de exercer o juízo. O versículo 22 diz que foram os maus que queriam proibir os que não foram guerrear de receber sua parte do despojo. Isso mostra que nós não vemos as coisas como elas são, mas como nós somos. Não se pode esperar justiça de quem tem um coração injusto. O coração de Davi era justo, logo suas ações refletiram o mais alto padrão de justiça. Injusto seria alguns poucos saírem com muitas coisas, e outro tanto sem nada. Como alguém já disse, “é melhor muitos comerem pouco do que poucos comerem muito”.

A desigualdade que vemos nas várias camadas sociais é resultado de um conceito deturpado de justiça. Um coração justo não pensa apenas em seu próprio benefício, mas no bem comum.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Uma reverência e um beijo

Por: Philip Yancey


A adoração verdadeira revela tanto a amizade quanto o temor a Deus.


O cristianismo afirma um lugar único entre as religiões do mundo. Nossa fé fala de um Deus diante de quem os mais poderosos santos tiram os sapatos, curvam-se, rosto em terra, e arrependem-se no pó e na cinza. Ao mesmo tempo, ela afirma que um Deus que veio à terra, como um bebe, que mostrou carinhosa misericórdia para com as crianças e os fracos, que nos ensinou a chamá-lo de Aba, que amou e foi amado. Os teólogos dizem que Deus é transcendente e imanente. Deus inspira, ao mesmo tempo, respeito e amor, temor e amizade.

Para os mais modernos, no entanto, o sentimento de respeito surge com muita dificuldade. Domesticamos os anjos até transformá-los em brinquedos de pelúcia e ornamentos natalinos, fizemos cartões de São Pedro nos portões do céu, amansamos o fenômeno da Páscoa com coelhos desajeitados e substituímos o respeito dos pastores e dos magos por duendes fofinhos e um homem divertido vestido de vermelho. O Deus todo-poderoso ganhou apelidos, como 'O Grande Cara' e 'O Homem Lá de Cima'.

Em fevereiro de 2005, esta revista publicou um artigo que trata de um assunto que me irrita. Qual foi o processo que levou a palavra adoração tornar-se sinónimo de música? Por muitos meses, minha igreja procurou um 'pastor de adoração' e houve um desfile de candidatos para uma audição, com suas violas e grupos vocais. Sim, alguns deles oraram: 'Senhor, apenas o Senhor sabe, esteja verdadeiramente conosco esta noite e deixe-nos saber que está aqui'. Ninguém mostrou muito conhecimento de teologia e, seguramente, ninguém nos levou a sentir algo como respeito. Hoje, adoração significa preencher com barulho qualquer espaço de silêncio.

Saúdo o sentimento de celebração e alegria aparente em muitas músicas actuais. Ainda assim, espanta-me o que deixamos de lado quando tentamos reduzir a distância entre a criatura e o Criador, distância essa tão eloquentemente expressa por Jó, Isaías e os salmistas. João, o discípulo a quem Jesus amava, que reclinara a cabeça sobre Jesus, registrou, em Apocalipse, que caiu aos seus pés como morto, quando Jesus apareceu em toda sua glória.

O estilo de adoração oscila de cá para lá, como um pêndulo, do ortodoxo ao doukhobors, do anglicanismo aos quacres, do luteranismo ao moravianismo, de igrejas aprovadas e estabelecidas às igrejas contracultura emergentes; e, talvez, precisemos de um pouco das duas. Certa vez, Sören Kierkegaard disse que lidamos com a adoração como se o pastor e o coro fossem actores, e a congregação, a audiência, quando, em vez disso, Deus deveria ser a audiência; o pastor e o coro, os incitadores; e a congregação, os verdadeiros participantes. O que apresenta uma questão interessante: que tipo de música Deus prefere? Parece que temos muito tempo para aprender a resposta a essa pergunta, pois Apocalipse apresenta muitas cenas de criaturas adorando Deus por meio da música e da oração.

Abraham Heschel, eticista e escritor judeu, fez a seguinte observação: 'Respeito, ao contrário do temor, não nos faz encolher diante do objeto de respeito, antes, leva-nos para perto dele'. Martinho Lutero disse que devemos orar com a reverência dirigida a Deus, e a ousadia, a um amigo.

Um líder de adoração, que causa um crescente impacto na música cristã, tenta manter em criativa tensão esses dois elementos de respeito e temor. Matt Redman, autor de canções como Heart of Worship [Coração de adoração], Better Is One Day [Um dia melhor] e Let My Words Be Few [Que minhas palavras sejam poucas], lidera o grupo Soul Survivor, que se reúne num grande armazém em Londres, Inglaterra. Certo ano, Redman e seu pastor, preocupados com o fato da música de adoração ter se tornado o foco dos músicos, em vez de Deus, deram um audacioso passo e eliminaram totalmente a música do culto de adoração. Após esse período de 'jejum', ele emergiu com uma nova compreensão de adoração. Conforme declarou em uma entrevista no rádio:

[Adoração] é mais bem resumida em Efésios 5.10, que afirma: 'Aprendam a discernir o que é agradável ao Senhor'. Se falar sobre música, na verdade, quer fazer uma oferta que o agrade e, obviamente, ele não está preocupado com a música em si, o estilo ou se você toca no tempo certo e coisas assim. Quando despeja seu coração na música e apoia isso com sua vida, esse, provavelmente, é um coração de adoração.

Um disco de Redman, lançado em 1998, chamado The Friendship and the Fear [A amizade e o temor], título retirado de um versículo de Salmos 25: 'O Senhor confia os seus segredos aos que o temem, e os leva a conhecer a sua aliança' (v. 14). Redman continua a explorar a região fronteiriça entre o respeito e o temor, pois a autêntica adoração engloba ambos. Essa é a resposta apropriada, quando o Deus santo faz um convite à intimidade para o ser humano imperfeito. No Antigo Testamento hebraico, a palavra original para adoração significava 'curvar-se em reverência e submissão'. No Novo Testamento, a palavra grega mais usada para adoração significa 'apresentar-se para beijar'. Entre esses dois significados — ou em uma combinação de ambos — encontra-se nosso melhor caminho para Deus.

Copyright © Christianity Today. Usado com permissão do autor. Todos direitos reservados. Maio de 2005, Vol. 49, Nr. 5, Página 80.

Tradução Carlos Cunha

terça-feira, 19 de abril de 2011

A igreja e o pecado

Por: Jease Costa [adaptado do meu livro "Vencendo o Pecado" e usado com permissão da editora Abba Press]


Uma vez que Cristo deve ser o nosso modelo, vamos avaliar o modo como Ele lidou com o pecado e a forma como tratou os pecadores. Para isso, faremos uma análise da narrativa da mulher adúltera, que está registrada em João 8:1-11. É verdade que essa narrativa não consta dos originais mais antigos, sendo assim, uma inserção posterior ao texto joanino (inclusive, há versões que o deslocam para outra parte). No entanto, a tradição cristã nunca manifestou dúvidas quanto à sua veracidade. Pelo contrário, sempre aceitou esse incidente na vida de Jesus como sendo efetivamente genuíno. Afinal, num contexto de extrema influência farisaica que outra pessoa teria agido assim, além de Jesus?

Vemos nessa passagem três classes de pessoas encontradas na igreja. A última classe, porém, não tão facilmente. São elas: o pecador (a mulher apanhada em adultério), os legalistas (os escribas, ou “mestres da lei”, e os fariseus), e o misericordioso (Jesus Cristo). Não pretendo avaliar aqui questões circunstanciais, como o fato de eles estarem querendo apanhar Jesus em uma contradição e o fato de não haverem também levado para o julgamento do Mestre o homem que estava adulterando com aquela mulher. Quero avaliar apenas a questão da aplicação da lei diante do pecado e a atitude de Jesus em relação à lei e à mulher flagrada em adultério.

A mulher adúltera representa todos nós (sem exceção!); os legalistas, a postura prática comum de boa parte da igreja diante de alguns tipos de pecados (principalmente sexual); e Jesus, o que a igreja deveria ser com qualquer pecador. Sejamos honestos. A mulher adúltera representa todos nós. A assertiva de Jesus tinha cabimento: “Quem não tiver pecado atire a primeira pedra”. O quadro da igreja é exatamente o dessa história. Apenas alguns são expostos, mas na realidade, o pecado é um problema de todos. A proporção não é exatamente a que aparece no primeiro momento da história, com um pecador e uma multidão de santos, mas a que Jesus, com suas assertivas, faz aparecer. Quem não tiver pecado... Quem não tem? O resultado foi que, um a um, todos foram embora. O que nos diferencia uns dos outros é apenas a aparência exterior, pois lá dentro somos todos iguais. Todo potencial para o pecado, e até mesmo para atos bárbaros e desejos sórdidos estão dentro de todos nós. Gene Getz, em seu livro “A Medida de Um Homem Espiritual”, no capítulo em que aborda que um cristão maduro nunca deve recorrer à violência, narra um acontecimento que expõe bem isso:

“Com relação ao que aconteceu na Alemanha nazista, Chuck Colson recapitulou o que assistira no programa ‘60 Minutos’ da TV. Comentando sobre o que vira, Colson declarou o seguinte:
Narrando uma história recente sobre o nazista Adolf Eichmann, um dos principais arquitetos do Holocausto, Wallace fez uma pergunta importante no início do programa: ‘Como é possível... a um homem agir como Eichmann?... Seria ele um monstro? Um louco? Ou era talvez algo mais aterrorizante: Um homem normal?’
Normal? O executor de milhões de judeus seria normal? A maioria dos espectadores ficaria indignada com esse pensamento!
A resposta mais surpreendente para a pergunta espantosa de Wallace foi dada numa entrevista com Yehiel Dinur, um sobrevivente dos campos de concentração que testemunhou contra Eichmann nos julgamentos de Nuremberg. Um clipe do julgamento de Eichmann em 1.961 mostrou Dinur entrando na sala de audiências do tribunal e parando de súbito ao ver Eichmann pela primeira vez desde que os nazistas o haviam enviado a Auschwitz dezoito anos antes. Dinur começou a chorar descontroladamente, depois desmaiou, caindo no chão enquanto o funcionário que presidia o julgamento pedia ordem na sala lotada.
Dinur fora tomado pelo ódio? Medo? Lembranças terríveis? Nada disso. Pelo contrário, como explicou para Wallace, Dinur compreendeu num instante que Eichmann não era o oficial-deus que mandara tantos para a morte. Este Eichmann era um homem comum. ‘Fiquei com medo por mim mesmo’, afirmou Dinur, ‘Vi que eu era capaz de ter feito aquilo. Que sou exatamente como ele’”.

Essa narrativa é impressionante em vários aspectos, principalmente porque expõe a verdade de que somos todos iguais e temos o mesmo potencial para o mal. Assim, o que Jesus queria ao afirmar que quem não tivesse pecado estaria autorizado a atirar a primeira pedra, era fazê-los verem-se a si mesmos naquela mulher que estavam querendo condenar. Se a condenassem, então teriam que condenar a si próprios.

Veja bem, Jesus não desprezou a Lei, pois até admitiu que ela poderia ser aplicada naquele caso, e nem minimizou a gravidade do pecado da mulher, pois lhe ordenou categoricamente que, ao ir embora, não o praticasse mais. O que Ele fez foi expor o fato de que somos todos miseravelmente pecadores, inclusive em se tratando dos pecados que abominamos nos outros, e amar profundamente aquela pecadora dando-lhe a oportunidade de recomeçar, reconstruir.

Se o comportamento de Cristo deve ser o padrão para o comportamento da igreja, talvez a igreja esteja fora de padrão. Quantas vidas destruídas e quantas pessoas afastadas para sempre da comunhão dos salvos. Quantas vidas poderiam estar brilhando, mas foram apagadas de vez por falta de misericórdia. Quantas árvores ainda poderiam estar frutificando, mas foram arrancadas sem piedade em função de um conceito inadequado e antibíblico do que seja disciplinar. E o ato disciplinar na igreja tem sido, em alguns casos, mais inadequado ainda quando é aplicado à liderança. Quando um líder cai, só mesmo a graça de Deus tem sido capaz de levantá-lo, pois a igreja não tem conhecido a palavra perdão. Mesmo se ele consegue restaurar sua vida ministerial, ainda sofre com o preconceito dos seus colegas e fica quase que eternamente estigmatizado. As palavras de ordem são exoneração e exclusão. Tem sido quase que impossível ver líderes com a vida ministerial reconstruída sem as marcas do passado depois da queda.

Quanto à ação disciplinar que deve ser aplicada à liderança, devemos nos espelhar também em Jesus. Como ele agiu? Como disciplinou um líder que caiu? Temos um exemplo clássico do trabalho do Mestre nesse sentido na narrativa da restauração de Pedro. Seu pecado foi realmente grave. Tão grave que se ele fosse um pastor de uma de nossas igrejas, hoje, jamais iríamos querer ser pastoreados por ele dali por diante. Como ser liderados por alguém que tão deslavadamente se acovarda afirmando publicamente que não sabe quem é aquele que havia sido seu mestre (Mc 14:66-72)? No entanto, qual foi a reação de Jesus após sua ressurreição ao encontrar-se com Pedro? Ele amou a Pedro e viu que quando ele chorou amargamente (vs. 72), estava tendo um arrependimento sincero. Isso bastava. Já era suficiente. Pedro fazia parte novamente dos planos do Senhor (Jo 21:15-17). É comovente ver que Jesus, mesmo depois de tudo o que Pedro lhe havia feito, ainda estava interessado em seu amor. Mesmo que não fosse um amor perfeito (ágape), já lhe bastava sua amizade profunda e sincera (filéo). De acordo com o Dr. Russel Shedd, quanto à disciplina de Jesus aplicada a Pedro nesse episódio, “o Senhor ofereceu-lhe a mão graciosa de recuperação total” (Disciplina na Igreja).

Sendo Jesus o modelo para o comportamento e ação da igreja no mundo e em relação aos seus, talvez seja momento de repensarmos a nossa caminhada. Jesus mostrou que mesmo um líder pode voltar às lides ministeriais, pois o perdão de Cristo (que deveria ser sempre aplicado pela igreja) é o perdão restaurador. O Dr. Shedd mais adiante ainda enfatiza:

“Há pecado tão grave que a igreja não é capaz de perdoar e esquecer até o ponto de repor o líder iníquo no seu antigo lugar privilegiado de ministério. Mas tal não foi o caso de Jesus ao manejar a restauração de Pedro. Nenhum dos evangelhos diminui a seriedade da apostasia de Pedro. Se tivesse negado uma vez, ainda vai, mas três vezes, e isso com juramentos e maldições (Mt 26:74), nos levaria a perder a esperança. Mas o olhar de Jesus fixado em seu discípulo o abalou por completo. Então Pedro, saindo dali, chorou amargamente (Lc 22:62). Esse sinal de profundo arrependimento foi suficiente para Jesus.”

O arrependimento sincero também não deveria ser suficiente para a igreja ao aplicar a disciplina aos seus que caem, líderes ou não? Não foi assim que fez Jesus? Será que não é nossa responsabilidade reproduzirmos Jesus em nossa caminhada como igreja Sua?